labrys, études féministes/ estudos feministas
janeiro/ junho 2016 - janvier/juillet 2016

 

Hildegard Baum e Alice Brill, formação e despertar

    da sensibilidade: Entre Vanguardas e Sombras

 Yara Schreiber Dines

 

 

Resumo:

No artigo abordo a formação e desenvolvimento de Hildegard Baum e de Alice Brill, na Alemanha do início do século XX. As duas futuras artistas crescem num país em crise política e social, apresentando um cenário de passagem da República de Weimar para o início do nazismo. É exposto o clima político reinante, assim como aspectos da situação social das mulheres na época neste país, para se ter uma noção dos valores e mentalidade vigente em relação à questão de gênero. Também é introduzido um panorama do contexto artístico presente na Alemanha, com características da cultura visual que influenciam as suas formações, repertório e olhar. Concluo o artigo comentando o exílio das duas artistas para São Paulo/Brasil e suas formas de inserção profissional e artística na cidade como mulheres fotógrafas.

Palavras-chave: gênero, Hildegard Baum, Alice Brill, exílio

 

prólogo

Duas meninas nascem na Europa, respectivamente na Suiça e na Alemanha - entre os anos 10 e 20, do século passado – vão viver em um período turbulento. Crescem em uma Alemanha, pós I Guerra Mundial, em um contexto de ressaca, desgosto e amargor, com a rendição deste país e a perda do armistício. Por outro lado, elas  também convivem com o clima reinante da República de Weimar e da vanguarda artística deste país, que se expressa e manifesta intensamente nesta época, trazendo novos ares e possibilidades para o povo alemão, ainda que por um breve período.

Este é o cenário social e político que encontramos na época em que nascem Hildegard Baum (depois que se casa, Rosenthal) e Alice Brill, que se tornariam fotógrafas, mulheres artistas, com sua produção na fotografia moderna -  objeto deste estudo. Neste artigo são desenvolvidos aspectos sobre a formação e influências culturais destas meninas, que crescem sob o peso e um clima cultural tenso, que se aprofunda com o surgimento da sombra do nazismo na Alemanha.         

Eric Dunning e Stephen Mennell, no prefácio do livro, Os alemães - A luta pelo poder e a evolução do habitus nos séculos XIX e XX  (1997), apontam que, o autor da obra, Norbert Elias  “descreve o Segundo Império da Alemanha - o unificado Kaiserreich de 1873-1918 - como uma satisfaktionsfahige Geselschaft, uma expressão de que é impossivel dar uma tradução direta, mas que significa uma sociedade gravitando em torno de um código de honra em que duelar, exigir e dar ´satisfação´ ocupavam um lugar de arrogantes destaques.” Para Elias, a unificação da Alemanha, envolveu assim a ´brutalização´ de vastos setores das classes médias.

Na obra, Elias estuda o enfraquecimento do controle do Estado na Alemanha, após a I Guerra Mundial, e como nesse contexto formaram-se brigadas militares de voluntários dos Freikorps, também formadas por confrarias estudantis nas universidades, fragilizando a República de Weimar e conduzindo a um movimento violento que se contrapunha ao debate do parlamento de Weimar e buscava a criação de um governo autoritário.

Em 1918, após a perda da guerra e de uma sucessão de revoltas operárias, ocorre a abdicação de Guilherme II, estabelecendo-se uma República parlamentarista, na Alemanha. Os social-democratas, antes de esquerda, conquistam o poder, esmagando a revolução socialista e promulgando a Constituição, em novembro de 1919. Nessas condições surge a República de Weimar, assim chamada, pois a Constituição foi assinada em Weimar, cidade da Saxônia. O quadro econômico difícil piora com as proposições políticas dos países que haviam vencido a guerra. De acordo com Daniela Alarcón:  

“Ao armistício, seguiu-se o Tratado de Versalhes, de 1919, que impunha à Alemanha perda de territórios, redução do contigente do exército e proibição do fabrico de material bélico, entre outras punições. A inflação subiu intensamente e, junto dela, as tensões sociais.”(Alarcon, 2008:26)

Para Hobsbawn (2001), a argumentação central do tratado  provinha da cláusula da ´culpa de guerra´, que castigava moralmente a Alemanha pelas consequências geradas pelo conflito. Assim, além de ações punitivas de caráter político e econômico, pairou sobre o país danos simbólicos intensos.<

Segundo Elias (1988), no livro citado, a perda da I Guerra Mundial tornou-se vivência inesperada e muito traumática. Tocou num nó sensível no ´habitus nacional´ e foi experimentada como um retorno ao período da fraqueza alemã , das forças estrangeiras no país, de um tempo na sombra de um passado mais vigoroso. Encontrava-se em suspenso o movimento de recuperação da Alemanha. Muitas pessoas das camadas médias e altas alemãs, possivelmente a sua maioria, consideravam que não poderiam aguentar esta humilhação. Assim, ponderaram que era necessário preparar-se para a próxima guerra, com melhores possibilidades de uma vitória alemã, ainda que no início não se tivesse ideia como isso poderia ocorrer.

Por habitus, Elias compreende como uma ´segunda natureza´ ou ´saber social incorporado´. O autor utiliza esta noção bem antes de sua disseminação por Pierre Bourdieu.  A noção é muito usada no sentido de ultrapassar questões como a antiga concepção de ´caráter nacional´, visto como fixo e permanente. Entende por esta ideia

“[...] que os destinos de uma nação ao longo dos séculos vem a ficar sedimentados no habitus de seus membros individuais, e daí decorre que o habitus muda com o tempo precisamente porque as fortunas e experiências de uma nação (ou de seus agrupamentos constituintes) continuam mudando e acumulando-se.” (1988:8)

Em 28/06/1919, o Tratado de Versalhes é assinado. A Alemanha perdia a Alsácia-Lorena e suas colônias africanas. Também foi obrigada a ceder territórios para a Polônia, Tchecoslováquia, a Bélgica e o Sartre ficava sob o domínio da Sociedade das Nações. Por outro lado, o serviço militar foi cancelado.

Em relação à redação da constituição, havia um forte debate sobre a democratização das instituições políticas e econômicas, porém a palavra democracia ficou de fora do texto. Assim a Alemanha era denominada simplesmente como uma República  “cujo poder político emanava do povo” (Lionel, 1988:54).

Nas palavras de Richard Lionel, em A república de Weimar, se, antes da república, esta cidade concentrava os maiores nomes da cultura alemã, como Goethe, Schiller, Bach e Liszt, “ na memória do povo alemão, Weimar não simbolizava mais a herança cultural clássica. Sua fama recente tendia a apagar o resto. Devia-se menos à votação da constituição do que à aceitação da paz nas condições impostas pelos aliados. Nos espíritos, ela evocava infalivelmente as palavras ´capitulação´, ´aviltamento´, e ´fraqueza´. Logo as reparações a pagar e a ocupação do Ruhr pelas tropas francesas, viriam alimentar esse sentimento quase geral de espoliação injusta. Os nacionalistas, depois os nazistas, logo aprenderiam a tirar dali a incitação à desforra, e, de novo, a guerra.” (1988: 55).

De acordo com o mesmo autor, a  República de Weimar fora fundada, portanto. Surgia de uma revolução sufocada, de uma coalização criada entre as antigas classes sociais em destaque sob Guilherme II, membros integrantes do exército imperial e os lideres do Partido Social-Democrata. Perante o quadro de sua formação, com muita dificuldade conseguiria impedir de ser esmagada pelos grupos de direita.

Para Louis Dupeaux, em História Cultural da Alemanha (1992), a atuação de vanguarda relacionada à Alemanha, neste período, não abrangia as expressões de cultura mais relevantes, a cultura clássica permanecia prevalecendo. Por exemplo, nas artes plásticas, em paralelo, ao expressionismo, grande parte do público continuava fidedigno a valores já reiterados das pinacotecas históricas alemãs.

Nos anos 30, Peter Gay (1978) afirma que “ intelectuais e artistas dirigem sua angústia para a criação: a vanguarda que então se desenvolveu era dramaticamente politizada. Com o advento da República, os que antes empenharam seu senso crítico contra o governo de Guilherme II (1888-1918), associando-se aos males da I Guerra Mundial, deslocaram seu foco para as contradições inerentes ao novo governo, que abririam espaço para a ascensão do nazismo.” Peter Gay considera que a criação da República de Weimar intensificou o peso intelectual e artístico dessa geração.

Elias entende que a entrada de Hitler no poder e os genocídios nazistas foram provenientes necessariamente das fontes estruturais de configuração da sociedade alemã, que é formada pelas condições sociais, políticas, econômicas e de mentalidade da época. E que o processo nacionalmente estigmatizante se deu em decorrência de decisões efetuadas em uma situação de crise nacional por grupos com forte influência, que possuíam grande apoio popular, principalmente da classe média e que atuavam em consequência de aspectos que estão intensamente calcados no “habitus, personalidade, idiossincrasia, estrutura social e comportamento alemão (1988: 8).”

Este autor também entendeu, em relação a conjuntura em estudo, um anseio de uma volta ao governo de um ´homem forte´, uma rejeição ampla pela democracia parlamentar´; um maior domínio político do grupo ´semi-educado´ e, principalmente, como o povo alemão foi muito atacado moralmente nos anos 30 se deixou conduzir e ser dominado por Hitler, espécie de curandeiro e feiticeiro político, com sua promessa idílica de concretizar o antigo sonho alemão de um Reich europeu, no qual os alemães usufruiriam sem grandes penas do prestígio de integrar a denominada ´raça ariana de senhores´. Na época, Thomas Mann comentando sobre o clima social reinante, afirma que o

“[...]país parece ser um terreno singularmente receptivo ao irracionalismo, está submerso de jargão irracional. Por toda parte domina, diz ele, em 1929, uma vontade de ´restabelecimento´. Em triunfo, no seu direito vital primitivo, as forças das trevas e das profundezas abissais, o instintivo, o irracional.“ (apud Lionel, 1988: 246)

Assim, a frágil República de Weimar, na Alemanha - que durou praticamente até a crise econômica de 1929, nos Estados Unidos, com a grande depressão gerada, a nível mundial - trazia em seu bojo instabilidade social. Portanto, a história política desta república é um tema marcado pela incerteza.

Richard Lionel levanta a seguinte questão sobre a configuração social da Alemanha, vislumbrada no fim dos anos 20: “O que se quer? Uma elite que exerça verdadeiramente a sua autoridade e não um Parlamento e partido impotentes; uma Alemanha que se encarregue da salvação da raça branca e da civilização européia; um Estado forte.” (Lionel, 1988, 251)

 

as mulheres na Alemanha, anos 1920 e 1930

Para situar o contexto social em que viviam as mães de Alice Brill e Hildegard Baum -  respectivamente Anni Baum e Marte Brill e também do nascimento de suas filhas - suas formas de inserção, sociabilidade e convívio na sociedade do período em estudo - apresento um panorama da condição social das mulheres.

Nos anos 20, a regra para a situação das mulheres é uma vida em condições difíceis e o início de reinvindicações do direito à liberdade e mesmo campanhas e manifestações contra a repressão do aborto. Contudo, dentro de uma atmosfera de exceção, surgem novos tipos de mulheres como `à la garçonne´, que é esportiva e sexualmente liberada.

Em 19/01/1919, quatro dias após o assassinato de Rosa de Luxemburgo, dentro do contexto do surgimento de república de Weimar, as alemãs votam pela primeira vez. De acordo com Richard Lionel, em Berlim 1919-1933 A encarnação extrema da modernidade (1993), 90% das mulheres votam.

Além disso, como afirma o autor “ser datilógrafa”: eis o sonho de todas as jovens berlinenses da classe operária - entrar para a classe dos colarinhos  brancos - e das moças de classe média cujos pais não podem pagar os estudos no colégio ou no liceu”. (Lionel,1993: 95,96)

Lionel comenta :

“[...]a estenógrafa, a secretária, a vendedora encarnam então em Berlim o tipo da ´nova mulher ´. É uma mulher que cortou as tranças para pentear-se ´à la garçonne´ e cujas pernas são depiladas. Consciente de seu valor, materialmente independente, esportiva, sexualmente liberada´, tem a audácia de sentar-se sozinha nos cafés e fumar em público.”(Lionel, 1993: 96)

As mulheres da classe média também realizam visitas às casas das amigas, ainda durante a guerra. As visitas são como uma festa e ritual para a época, num ambiente  em que tricotam a lã e a amizade, ou mesmo conversam em torno de uma xícara de chá ou café e um bolo.

Já as berlinenses cultas encontram as amigas no teatro, ou nos salões literários. Neste período, também mostram grande entusiasmo pela psicanálise e pela astrologia.

Os estudos universitários são realizados somente por 10% das mulheres, sendo que é importante destacar, que “nenhuma das 10.595 alemãs, que, em todas as disciplinas , obtém o doutorado, entre 1908 (data da entrada em vigor da lei que abre as mulheres  o acesso ao ensino superior) e 1933, consegue uma cadeira na universidade” (Lionel, 1993: 101). Neste sentido, “em 1933, menos de 30% das mulheres casadas trabalhavam, índice inalterado desde 1925.” (apud Alarcon, 2007:41)

Em 1933, com a ascensão dos nazistas ao poder, os escritórios de planejamento familiar são destruídos e seus responsáveis encarcerados. Também, muitas operárias voltam a realizar somente o trabalho doméstico, em virtude do conservadorismo vigente. Assim muitas mulheres neste período comentavam que não exerciam uma profissão, trabalhavam.

 

cenário artístico e fotográfico, no final da década de 1920 - a Nova Visão e a Nova Objetividade

Nomes de artistas como Bertold Brecht, Georges Grosz, Fritz Lang, Kurt Weil, dentre vários outros, atraíam a atenção e o debate cultural  no universo da arte, no final dos anos 20.

De acordo com Lionel,

“ [..]nos meses de agitação revolucionária que se tinham seguido ... a Ia Guerra Mundial, um movimento de atividade criadora de uma amplitude sem precedentes tivera início em toda a Alemanha. Todas as paixões reprimidas explodiam, todos os laços artificiais se quebravam. A vontade de romper com o passado, de construir algo novo, inflava a maior parte de uma geração de poetas e pintores que, apenas saídos da adolescência, tinham sido atingidos pelas atrocidades da guerra. Seu ideal? Regenerar a humanidade, abrir caminho para o reinado de um homem novo, de um homem verdadeiramente humano!” (Lionel, 1988: 255).

Contrapondo-se ao período imperial, diversos escritores, pintores, arquitetos, músicos não pretendem mais trabalhar para o prazer estético da classe dominante.

“Para eles, a atividade artística deve ser integrada ao conjunto da atividade social. Isso é o que pensa especialmente Walter Gropius quando funda a Bauhaus em 1919. Construir, diz ele, não é criar arte, mas sim vida, dar forma à vida.” (Lionel, 1988: 255)  

Em 1920, os partidos de direita obtém 46% dos votos. Os anseios rebeldes iniciam o seu declínio em todo o país. Sobra muito pouco do grande movimento coletivo ao qual haviam aderido muitos poetas, dramaturgos, literatos, artistas. Algumas revistas e grupos ainda permanecem atuantes, porém o fluxo de utopia e os ânimos exaltados em prol da mudança da humanidade passam a ficar contidos e em baixa.

Expressões fílmicas da época como `O gabinete do Dr. Caligari´, de Robert Wiene, ‘ Nosferatu´, de Murnau, ´Dr. Mabuse´, ´O Jogador´, de Fritz Lang, mostram silenciosamente, por meio da iluminação e personagens, a desordem do começo dos anos 20, com os instintos que se desdobram e os tiranos à espreita.

O cenário se altera, efetivamente, desde 1925. As tendências artísticas se direcionam para o social, assim ganha destaque a busca do concreto, da pesquisa sociológica, da reportagem. Após a fase da imaginação e da intuição, há o reingresso ao ´direto´, ´puro´.“ A pintura recupera a sobriedade, uma representação quase naturalista. Otto Dix, autor expressionista e antigo dadaísta, que simpatiza com o Grupo Vermelho, em torno de George Grosz e de John Heartfied, depois com a Associação dos Artistas Plásticos Revolucionários, disse mais tarde:

´Arte, os expressionistas tinham feito demais. Nós queríamos que as coisas fossem vistas no seu despojamento, em toda a sua evidência - quase sem arte.”  (Lionel, 1988: 258)

O período de 1923 a 1929 foi uma época dinâmica para a fotografia de vanguarda na Alemanha da República de Weimar e a Staatliches Bauhaus representou o seu fórum mais relevante, ainda que só introduzisse a fotografia em 1929.

A Nova Objetividade, tendência artística muito relevante na época, tinha como objetivo  ´constatações´, ´narrativas´, ´relatos´. A procura pelo concreto, característica da república de Weimar, de 1925 a 1930, apresenta como saldo positivo, chamar a atenção para as artes vistas como menores. Com o destaque das revistas ilustradas, a tipografia, a fotografia e a fotomontagem são foco de interesse e de valorização. As artes gráficas alcançam na esfera cotidiana, um espaço privilegiado, artistas, vindos do universo da pintura, integraram essa expansão : Hans Bellmer, John Heartfield, Lászlò Moholy-Nagy, Jan Tschichold. 

Integrando a tendência da Nova Objetividade, na mesma época, a fotografia alcança maior destaque. O aprimoramento dos equipamentos e o gosto pelo conhecimento da técnica propiciaram essa atração.

Lászlò Moholy Nagy foi o principal agente para a relevância da fotografia na Bauhaus.  Entendia que a fotografia criava uma linguagem visual ideal para as demandas inovadoras da sociedade moderna.

De acordo com o autor Richard Lionel, na fotografia três orientações principais se revelam - uns são tentados por uma fotografia experimental, que necessita de esforços de invenção e de construção, um verdadeiro jogo de formas. Moholy-Nagy, com o seu livro Malerei Fotografia Filme (Pintura, fotografia, cinema), de 1925, aparece como um pioneiro, formulando a estética da Nova Visão neste livro.Esta tendência também utilizou formas de linguagem incomuns como fotogramas e fotomontagens que mesclavam fotografia com a tipografia moderna.

A Nova Visão irá ocupar a frente da cena fotográfica alemã durante o fim do decênio e alcançar seu maior destaque em 1929 com uma série de grandes exposições e publicações que divulgam o movimento.

Max Burchartz, Grete´s eyes,1928 (Nova Visão)

Por outro lado, a segunda orientação da fotografia - o realismo social - caracteriza os retratos de August Sander reunidos em 1929, em Face of our Time (que, depois foram inseridas em People of the 20th Century, 2002), da mesma forma que o movimento dos fotógrafos operários animado por Hermann Leupold. Alguns, finalmente - terceira orientação da fotografia - , pretendem renunciar a qualquer distância crítica e desaparecer em relação ao objeto fotografado, para lhe dar uma autenticidade absoluta: resultados desse programa, o álbum de Albert Renger-Patzsch, O mundo é belo, de 1928 e de Hanns Gunther, A Beleza técnica, de 1929 (1988:262).

August Sander, People of the 20th Century

Para Juliet Hacking, organizadora da obra de referência Tudo sobre Fotografia (2012: 208), ao comentar sobre a fotografia de vanguarda na República de Weimar, considera que:  

“[...]as regras convencionais da fotografia foram igualmente desafiadas, quando fotógrafos apontavam a câmera para cima ou para baixo, usavam linhas diagonais ou realçavam os detalhes, criando close-ups dramáticos, vistas aéreas de vias urbanas ou paisagens transformavam superfícies comuns em padrões geométricos....”.

Albert Renger-Patzsch foi tão relevante na época quanto Moholy-Nagy, o primeiro é o precursor da proposta estética da Nova Objetividade, na fotografia. Em princípio, foi experimentada por pintores alemães, no período entreguerras como antagonismo ao expressionismo. Renger-Patzsch entendia que a fotografia deveria se concentrar em documentar a realidade, o que via como a função primordial da câmera. O público não deveria ficar condicionado ao olhar subjetivo do fotógrafo e a esquemas de composição visualmente atrativos, mas o fotógrafo deveria destacar um objeto registrando-o em aspectos realistas e sutis. Para tal finalidade inseria o objeto no centro de um quadro proporcional somente sobrando ao receptor/público observar o próprio tema.

Albert Renger Paztsch, A muda de árvore, 1929

Moholy-Nagy e Renger-Patzsch apresentaram suas propostas divergentes na revista Das Deutsche Lichtbild (A fotografia alemã). Ainda que expusessem diferenças estéticas importantes, ambos possuíam muito em comum, pois entendiam a fotografia como uma forma de arte autônoma e criaram uma estética ´direta´, sem manipulação para a fotografia, que se tornou muito relevante no meio artístico, na época, e mesmo para alguns fotógrafos, posteriormente.

Destaca-se a importância da apresentação destes perfis das correntes da Nova Visão e da Nova Objetividade, pois marcam a fotografia do final dos anos 20 e início da década seguinte, na Alemanha. Este arcabouço estético da fotografia traz referências de linguagem e de expoentes artísticos, principalmente no que se refere à Nova Objetividade, que irão influenciar o olhar e a produção das duas fotógrafas em destaque.

 

formação/despertar[1] de Hildegard Baum e de Alice Brill

O instante do despertar, de acordo com Walter Benjamin, pode ser visto como uma imagem, que cria uma linha de corte ou um intervalo entre as coisas. Esta imagem é entendida como dialética, pois se movimenta entre a presença e a representação, entre as mutações e as permanências. Tal metáfora do despertar, elaborada por Benjamin e interpretada por Didi-Huberman (2006), pareceu-me muito fecunda para pensar sobre a educação, a formação da sensibilidade e do olhar criativo das duas meninas, que se tornarão mulheres artistas.

Hildegard Baum

 

Lilly, Hans e Hildegard Baum, Frankfurt, c. 1917, Acervo particular de Lilly Schneider         

       

Hildegard Baum nasceu em Zurique, em 1913, na Suíça, mas seus pais eram alemães. De acordo com o depoimento do fotógrafo Juvenal Pereira (que se reportam às conversas com Verônica Rosenthal, filha de Hildegard Rosenthal), o casal Anni e Ernst Baum, pais de Hildegard (ainda não casados), foram para a Suíça, ela com tres meses de gravidez, tendo a filha lá e só retornando à Frankfurt, acompanhada de Hildegard, já com 3 meses de idade.

Como relata o depoimento, Anni ocultou a gravidez, em virtude da moralidade da época. Quando voltou de Zurique deixou Hildegard aos cuidados das tias solteiras, irmãs de Ernst, seu marido, pois o casal não possuía condições financeiras para mantê-la.[2]

O pai de Ernst Baum possuía um hotel no centro de Frankfurt, Hotel zum Hessenlaendch, e, no ano de 1918, ofereceu um dos quartos para que os pais de Hildegard pudessem abrigar a família, que ficou morando lá até 1922. “ Os pais casaram-se, quando arrumaram emprego e arrumaram a vida” (anotações do fotógrafo Juvenal Pereira). Depois, tiveram mais três filhos - Hans, Lilly e Walter. Até os 6 anos, Hildegard morou com o avô paterno e foi criada por ele e pelas tias solteiras, nesse período.

Durante a infância, Hildegard Baum e sua irmã Lilly estudavam em uma escola protestante para moças - Katharinenschule - em Frankfurt. Ela sempre foi atraída por crianças, sendo que, quando se tornou adulta especializou-se em Pedagogia, na França.

Na sua juventude, Hildegard Baum já andava com uma câmera fotográfica.  A partir do depoimento dado por ela, no Museu da Imagem e do Som, em 1981, foi extraído o seguinte excerto, narrando sobre a sua primeira foto, do qual se destaca:

“- Um dia, eu vi um menino muito compenetrado, muito sonhador, um menino muito inteligente, sensível. Ele tinha os olhos enormes, pretos, e ele estava sonhando. Eu tinha um aparelho fotográfico, nem sei mais o que foi, acho que 6X9, e eu tive a felicidade de tirar um retrato do menino numa pose muito extrovertida. Dei a fotografia para os pais e eles mandaram para Viena, para um concurso em um jornal muito famoso, o Neue Ferie Press (atual Die Presse) eu ganhei o 1º prêmio com essa foto” (apud Gonçalves, 2007: 124), no início dos anos 30.

A partir desta ocasião, ela passou a se interessar mais pela fotografia.

    Hildegard Rosenthal, Retrato de Menino, Frankfurt, c. 1931, Acervo Instituto Moreira Salles

Como apresenta a legenda da foto, trata-se de um retrato. Vemos pouquíssimos elementos na imagem, praticamente somente o rosto do menino, com seu cabelo curto, e sua sombra projetada foram focados e registrados, além de vislumbrarmos a gola de sua camisa, que parece estar sobreposta a uma outra blusa (ou colete ?) - ilações, a partir do recorte da imagem. A foto da jovem Hildegard mostra o seu interesse pelas crianças, o que já foi comentado antes, sendo que posteriormente, em sua produção em São Paulo, também irá realizar fotos de crianças de famílias estrangeiras.

A imagem também expõe um enquadramento - de cima - uma inovação, em época da  corrente da Nova Visão, no final dos anos 20, sendo que o foco se dá numa criança, que mostra um olhar bastante meigo, calmo e sensível.

Em virtude do enquadramento, a criança parece estar olhando para cima, como se estivesse divagando, sonhando, como afirma Hildegard Rosenthal, em seu depoimento, citado acima. Se toda foto é uma projeção de si mesmo, como considera Susan Sontag em Sobre Fotografia (2004), possivelmente, a jovem fotógrafa ao ver o menino com a expressão sensível e sonhadora, tenha se projetado neste olhar voltado para cima e em direção ao devir.

É interessante também constatar como o tipo de retrato realizado, com as características citadas, apresenta influências culturais da época, tendo ressonância visual com um olhar vigente da Nova Visão, no começo dos anos 30, tanto é que conquista o primeiro lugar, em um concurso de fotos, no maior jornal de Viena. 

László Moholy-Nagy, Untitled (Multiple Portrait), c. 1927, Collection Folkwang Museum, Essen  (Nova Visão)

 

Max Burchartz, Lotte (olho), c. 1928 (Nova Visão)  

 

Introduzo estas duas imagens selecionadas - retratos - respectivamente, de Lászlo Moholy-Nagy e de Max Bruchartz, integrantes da tendência da Nova Visão, que mostram propostas da fotografia da época, como a captação do movimento, a partir do registro em baixa resolução, assim como na segunda fotografia - um recorte, um fragmento de um rosto - que busca transmitir a ideia do todo. Estas imagens foram realizadas no final dos anos 20, dialogando com a do menino de Hildegard, de 1931.

Aos 18 anos, Hildegard Baum matricula-se em um curso de fotografia, oferecido por Paul Wolff,  com um ano e meio de duração. Este fotógrafo, foi o primeiro a utilizar a Leica para diversos trabalhos na fotografia.

De acordo com Paula Chrystina Scarpin Gonçalves, no seu trabalho Vale das Rosas.  Hildegard Rosenthal - pioneira da fotografia no Brasil[3]

“ [...]a Leica, câmera portátil de 35 mm, desenvolvida por Oscar Barmack e Maw Berek, começou a ser produzida em 1923, pela Companhia Leitz Wetzlar Factory, mas ´só é comercializada a partir de 1925. O aparelho de pequeno formato foi projetado para utilizar a mesma película do cinematógrafo.... O filme permitia 36 exposições sem recarga - uma revolução no trabalho do profissional”. (Gonçalves, 2007: 21)

Em 1926, Paul Wolff participou de uma mostra internacional de fotografia em Frankfurt e teve contato pela primeira vez com a Leica. O curso que Hildegard fez com ele, era direcionado para a prática da fotografia.

Este fotógrafo/professor teve uma grande influência na produção de Hildegard, inicialmente, pelo estímulo no uso da câmera de 35 mm, que foi a principal companheira profissional na sua vida. Ele dizia aos seus alunos : “- O instrumento mais importante de vocês, além da Leica, é a luz...” (Gonçalves, 2007: 22)

É relevante destacar, que até meados dos anos 30, a maioria das revistas ilustradas não permitia o uso da Leica. Hildegard afirma em seu depoimento ao Museu da Imagem e do Som (1981):

“Bom, primeiro, ele tinha certa dificuldade de convencer a pessoa se acostumar com a 35 mm. Porque, era aquela época, que ainda tinha 13x18, 9x12, e para introduzir na cabeça da gente que a câmera rápida não dispensa o julgamento, o critério, o estudo da fotografia ...” (apud Gonçalves, 2007:141)

Em relação às aulas práticas do curso de Paul Wolff, Hildegard comenta em seu depoimento:

“- A gente entrou numa Mercedes Benz e foi mundo afora. E aí, ele fez uma coisa que não era usual também (...) Ele procurou o interior da Alemanha, porque isso existe também, não só a cidade ... o campo, os camponeses (...) saíamos em grupo. E, antes de sair, ele fez um grande discurso sobre cada vez, sobre cada assunto. Vocês vão lá e entram numa casa assim, de sopetão... vocês procurem ser gentis.” (apud Gonçalves, 2007: 142)

Acredito que estas saídas e vivências fotográficas no campo e arredores de Frankfurt tenham marcado profundamente a jovem em formação, tanto é que quando vem ao Brasil, realiza esses tipos de saída para Pirapora do Bom Jesus e mesmo ao subúrbio de São Paulo, nos anos 50, indo fotografar no bairro de São Miguel Paulista. Além disso, é interessante notar a gentileza, a atenção e a especificidade destacada por Paul Wolff, no trato com o ´outro´ e o ´diferente´ nestas excursões imagéticas,  mostrando um olhar humanista na fotografia, o que estará presente nos registros imagéticos de Hildegard na cidade de São Paulo.

Posteriormente, no curso de fotografia realizado no Instituto Gaendel, também em Frankfurt, que durou tres anos, Hildegard estudou química e também praticou muito revelação e ampliação no laboratório, aprendendo a utilizar os equipamentos e químicos nos seus negativos. Como comenta ;  

“[...]e lá era tão caprichado, que a gente tinha que fazer as próprias fórmulas. Naquela época, eu andei com as mãos e braços, tudo cor de lilás, porque a gente usava parafenilenodiamina.”(apud Gonçalves, 2007: 25)

Em 1933, Hildegard esteve, pela primeira vez, em Paris, para continuar os estudos. Lá conheceu Walter Rosenthal com quem viria a se casar. Ele também estava na França para estudar. Vinha da Alemanha e era judeu. Enquanto Hildegard viveu na França, trabalhou como ´au pair´, uma espécie de governanta/babá, em algumas casas, sendo que havia exercido função semelhante, anteriormente na Alemanha.

Segundo Gonçalves, (2007: 27), talvez Hildegard tenha trabalhado na casa da família Staffenhagen em Frankfurt, e, mais tarde, conheceu Walter na casa de outra família em Paris.

A jovem conseguiu uma bolsa de estudos para estudar Pedagogia na França, segundo o depoimento de Lillly Schneider, sua irmã (apud Gonçalves, 2007:28). O casal de namorados permaneceu um ano em Paris, e, posteriormente, voltou para a Alemanha. Hildegard chegou a ser contratada como fotógrafa pela empresa Rhein Mainischer Bildverlag, em 1935 (Catálogo do IMS: c. 1997). Mas, como a perseguição contra os judeus estava mais acirrada nesse último país, retornaram a Paris. Nesta época, Hildegard afasta-se da casa de seus pais e de seus irmãos, em virtude do perigo nazista. De acordo com o depoimento do fotógrafo Juvenal Pereira, a jovem teria fugido com seu namorado para Paris, pois seu irmão teria denunciado-o à Gestapo.

Na França, Hildegard trabalhou na casa do casal Mark Szwarc e Eugenia Markowa. Marek era escultor, tendo estudado na École des Beaux Arts em Paris, em 1911. Hildegard, durante a permanência na casa do casal conheceu artistas e intelectuais do círculo de amizades deles. Entre estes, por exemplo, Jankel Adler, que  havia conhecido na Alemanha o pintor lituano Lasar Segall, um pouco antes de se mudar para o Brasil.  Assim, posteriormente, Jankel Adler  escreveu a Lasar Segall, que a introduziu no círculo artístico e intelectual do Brasil.

Walter Rosenthal estimulava muito a paixão de Hildegard pela fotografia. “Quando ainda trabalhava como ´au pair´, Hildegard andava com uma Leica ´emprestada do namorado, pois era muito cara e eu não tinha dinheiro para comprar uma.´ (apud Gonçalves, 2007: 32,33)

Na Alemanha, sabia-se muito pouco sobre o Brasil. Muitos dos judeus que procuraram estas terras tropicais vieram por mero acaso, ou seja, por falta de opção melhor ou porque já conheciam alguém residente nas capitais. Grande parte tentara, sem sucesso, os Estados Unidos, onde já possuía parentes, ou a Palestina.

Hans Rosenthal, cunhado de Hildegard, foi atraído por uma oferta de terras em Rolândia (PR), migrando com seus pais para essa cidade. Logo após ocorreu a chegada do irmão Walter, em 1936. No ano seguinte, Hildegard Baum chegava no porto de Santos para ficar com Walter.  

 

 

Alice Brill

Marte e Alice, Alemanha, 1931, Die Deutsche Bibliothek, Deutsches Exilarchiv 1933-1945

 

Os pais de Alice Brill eram intelectuais - a mãe Marte era jornalista, filha de pequeno-burgueses e o pai, Erich Brill, pintor, nascido em uma família de comerciantes da alta burguesia, que desaprovava o relacionamento do casal. Ambos provinham de famílias judias. Além disso, como escreveu Alice sobre o pai, “ artista nato e boêmio por convicção, seguramente, não era talhado para uma vida burguesa comum” (apud Alarcon, 2007: 34)

Alice Brill, no seu depoimento para o trabalho de Daniela Alarcon, Diário Íntimo - a fotografia de Alice Brill (2007: 26), comenta ”é compreensível que Wolf Brill não aceite esta nora (na época) que, de família intelectual, mas pobre, não em condições de trazer um dote para o casamento”. Marte engravidou e teve a sua filha Alice, mas o casamento se desfez no ano seguinte, pois Erich era um ´bon femme´.

Marte, que também foi escritora, escreveu no seu livro Der Schmeltztiegel, (O Cadinho)[4], não publicado em português, somente em alemão, em 2003, um poema que denominou de Meteoro (Meteor), referindo-se ao seu breve casamento com Erich:

“Quando as folhas de seiva jovem, / ainda se desdobrando em crescimento e enfeitando-se com flores / caírem por terra sob o toque de outono/ estarei só (...).”

Porém o par conservaria uma relação de proximidade e de cumplicidade intelectual, ao longo da vida.

Erich e Marte, ainda que não praticassem o judaísmo e de não transmitirem a Alice uma educação religiosa, possuíam laços com sua formação e expressavam interesse por sua história e cultura.

Os judeus alemães somente obtiveram igualdade de direitos civis, no término do  século XIX. Ainda que houvessem garantias legais, na Constituição de 1860, a equidade social só foi realmente conseguida na República de Weimar, época em que voltou a se intensificar o anti-semitismo.

Alice nasceu em Colônia, em 1920, porém cresceu em Hamburgo, aonde habitavam seus pais. Marte e Alice residiam em um conjunto residencial na periferia, aonde também moravam funcionários públicos, operários e integrantes da pequena burguesia.

A cidade de Hamburgo era um porto internacional, que gerava dinamismo na vida urbana e aspecto cosmopolita, por ser um centro econômico, mas também de trocas culturais. O porto configura-se como um polo econômico, associado à navegação, mas também revelador da identidade local. Marte definiu a cidade como um ´portal para o mundo´, no seu livro.

Ainda que os tempos de maior riqueza da cidade tivessem sido anteriores ao século XVI, ainda no começo do século XX, Colônia e Hamburgo caracterizavam-se como cidades econômicas e culturalmente importantes.

Em 1924, a Alemanha já apresentava sinais de melhoria econômica, pois a indústria foi modernizada, os salários aumentaram e o desemprego caiu (Alarcon, 2007:27).  Mas, a recuperação, não apresentava fundamentos firmes. Ainda que a Europa Ocidental tenha passado por uma fase de desenvolvimento econômico, após o término da guerra, a crise de 1929 já se esboçava.

Eric Hobsbawn, em A Era dos Extremos (2001:95), comenta que “ os efeitos da quebra da Bolsa de Nova York foram desastrosos para a Alemanha. Todo o castelo de cartas de reparações desmoronou durante a Depressão.  As exportações caíram e os empréstimos estrangeiros não foram renovados; a desvalorização da moeda conduzia à alta dos preços e, consequentemente, ao agravamento da pobreza.”

No ano seguinte, pouco sobrava do Tratado de Versalhes, sendo que o Estado alemão militariza-se e a população foi atraída pelo discurso ideológico do nascente Partido Nazista, que conseguiu expandir-se rapidamente.

Em paralelo, ao tenso perfil político e econômico alemão, a cultura de Weimar manifesta um apogeu fugaz, pois muitas expressões artísticas e intelectuais se deram em uma fase curta e precária. Mas, segundo Gisele Freund (1986), ainda que esta república fosse breve, ocorreu uma inovação magistral das artes.

Neste cenário sombrio, Alice era uma menina em formação. Daniela Alarcon (2007: 32) ressalta que os conceitos desenvolvidos no interior das escolas e tendências da arte, durante os anos 20 e 30 - “a integração entre as artes, a abolição da dicotomia entre arte e técnica, a nova visualidade, a criação coletiva e a ênfase na inserção do artista na sociedade - influenciariam Alice como artista plástica, como fotógrafa e teórica.” Podendo-se dizer o mesmo, em relação a Hildegard Baum, nossa outra mulher artista, em estudo, que vivia em contexto similar.

Comentando sobre a sua infância, na introdução de seu livro Da Arte e da Linguagem (1988:11), Alice afirma:

 “ desde a infância o impulso a criatividade, da auto-expressão, esteve, presente na minha vida, manifestando-se de formas diversas. Gostava de desenhar, de escrever e de tudo que depende de imaginação”.

O Expressionismo, a Bauhaus, a Nova Visão, a Nova Objetividade  e o fotojornalismo alemão constituem o pano de fundo criativo do ambiente vivenciado por estas duas meninas alemãs - Alice Brill, mas também Hildegard Baum - sendo que, posteriormente, suas fotografias trazem à tona aspectos desta experiência, em seu olhar e produção fotográfica, no Brasil.

Quando Alice deixa a sua escola, que tinha perfil modernizador, em virtude das ameaças nazistas, em 1931, seu pai Erich Brill “presenteou-lhe com um caderno de capa colorida, e assim escreveu na dedicatória: ´minha querida coelha, minha filhinha, escreva neste livro o que você quiser: pensamentos e histórias que estão em sua cabecinha” (Alarcon, 2007:31). Neste caderno e, em outros, Alice anotou histórias, seus deveres e também versos. Saliento este presente de Erich Brill para Alice, em sua infância, para mostrar como ela recebeu estímulos à expressão e à criatividade dos seus pais, desde pequena.

O ascenso do nazismo realizou uma ruptura na produção cultural alemã. No ano de 1933, não somente se dá a entrada de Hitler no poder, como também o fechamento da  Bauhaus e o esmagamento da arte ´degenerada´ e o desterro de artistas, pensadores e ativistas políticos.

Como escreve Peter Gay (1978), com os exilados que saíram da Alemanha, a cultura de Weimar que possuía um internacionalismo intrínseco em si, conseguiu se disseminar por outros países e conduzir manifestações artísticas críticas. Para este autor, “a cultura de Weimar compartilhou as experiências desenvolvidas em outros países europeus”. (1978: 19)

Com a entrada do regime nazista no poder, o anti-semitismo disseminou-se na Alemanha, como parte integrante da ideologia nazista, baseado em um viés racista da biologia, que defendia a concepção de superioridade do homem ariano, como afirma Peter Gay. A essas noções, somou-se o ethos vigente, influenciado pela propaganda nazista de que os judeus eram os responsáveis pela crise econômica na Alemanha.

Em virtude do quadro apontado, de exclusão social e econômica dos judeus, Marte é despedida da rádio de Hamburgo e, em março de 1933, parte com Alice para a ilha espanhola de Maiorca.Em seu livro Der Schmeltztiegel (O Cadinho), Marte personificada, no livro, como Sylvia,  comenta angustiada

” [...]a criança havia perdido tudo, mais do que os adultos, mais do que uma pessoa madura poderia compreender. Mas, ponderou ela ainda não sabia que perdera sua pátria para sempre.” (s.d.:32)

Erich deu a Alice de presente para a viagem uma câmera fotográfica - uma pequena e simples Bela Box, que fazia registros 3x4. As imagens do desterro como das ilhas da Madeira, em Portugal, em Tetuan e Casablanca, no Marrocos, em Alcudia e Maiorca, na costa espanhola, na Holanda e também do Rio de Janeiro e São Paulo - são testemunhos visuais dessas recordações de infância. Alice Brill possuí um acervo de mais de 200 fotografias em um pequeno álbum de couro, que abrange o registro do tempo entre a saída da Alemanha e o acolhimento no Brasil. 

Em Maiorca, Alice já apresentava um olhar sensível, “ observando tudo, desde o menor inseto ao comportamento humano, como afirma sua mãe em Der Schmeltztiegel (O Cadinho, s.d.).

Posteriormente, após a permanência em Maiorca, de mais de um ano, ambas buscaram um refúgio mais propício na Itália, porém não permaneceram muito lá, devido às condições adversas ali presentes, com a ascensão do fascismo.

Com o acirramento do regime nazista na Alemanha, Marte teve a fortuna de receber uma carta do editor-chefe da revista Hamburg-Sud, em que trabalhara na Alemanha, oferecendo duas passagens para que fossem ao Brasil, segundo destino mais comum na América do Sul a exilados judeus alemães, depois da Argentina.

Marte foi primeiro ao Brasil para preparar a vinda de Alice, em 1933. Sendo que Alice ainda permaneceu vivendo com o pai, um ano na Holanda.

      Alice Brill, Mercado espanhol, 1933,reprodução Daniela Alarcon, copyright acervo Alice Brill

 

Alice Brill, Alcudia, 1933, reprodução Daniela Alarcon, copyright acervo Alice Brill

    Alice Brill, Crianças, Holanda, 1934, reprodução Daniela Alarcon, copyright acervo Alice Brill

Nas tres imagens editadas acima - alguns registros do exílio - vemos fotos de paragens da Espanha pelas quais Alice e Marte passaram, antes de chegarem ao seu destino na ilha de Maiorca.

Na foto do mercado percebemos a atenção nos detalhes e minúcias perante as localidades visitadas, de passagem. Na imagem do mercado, ainda que não muito contrastada e sem muita nitidez, notamos um flagrante do registro do cotidiano, em seu movimento, a observação concentrada na disposição do corpo das pessoas ali presentes - do homem, à frente do legumes empilhados, em sacos,  assim como das mulheres, com seu lenços típicos, usados na Espanha, no período. Algumas décadas depois, em fotos de Alice realizadas na cidade de São Paulo, algumas também de mercados e feiras, iremos encontrar olhar semelhante em um registro documental substantivo de flagrantes da vida cotidiana.

Já na foto de Alcudia, 1933, aparentemente, chama a atenção de Alice o muro e uma construção de pedra, com suas torres, material muito utilizado na arquitetura local, na época. Estas obras, compõem assim, respectivamente, em primeiro plano, com a estrada de terra e a criança, à direita, ao fundo - planos diferentes recortados pelo seu olhar.

Por sua vez, a foto das crianças, na Holanda, parece uma montagem, em virtude de sua simetria - ou seja, vemos três moças, com as mesmas roupas e chapéus típicos femininos usados antigamente neste país, entremeadas por dois meninos, praticamente da mesma altura e também com vestimentas iguais, em uma rua/passagem de pedra, na frente do mar. Além disso, os dois meninos estão de mãos dadas com as moças, no meio delas, como se elas estivessem protegendo-os.

É interessante perceber que os rostos das moças dão um ar de anonimato e de homogeneidade à fotografia, pois seus olhares e expressões praticamente ficam escondidos pelos chapéus, além do fato de suas vestimentas, assim como dos meninos serem iguais. A impressão, que se capta da foto, “uma espécie de síntese deste país”, pois todos os personagens aparecem com trajes típicos, à frente do mar, que é um outro índice significativo deste lugar. Além disso, à frente do foto, fica registrada uma sombra alongada - Alice Brill e sua câmera fotográfica.

 

no exílio no Brasil, a morada

Tendo como arcabouço os fundamentos apresentados neste artigo - como a formação familiar, educacional e cultural, o desterro e os dramas sociais vivenciados por Hildegard Baum e Alice Brill, na Europa - a chegada e entrada no Brasil conduzem as duas jovens a outro momento, no exílio, no novo país, e, mais especificamente em sua inserção, como mulheres artistas e fotógrafas, em São Paulo, a partir de meados da década de 1930.

As duas artistas conseguiram o seu espaço de trabalho como mulheres fotógrafas, na metrópole paulistana, apesar das dificuldades da época quanto a aceitação do trabalho feminino, produzindo para agências jornalísticas, o Museu de Arte de São Paulo, gerando retratos de artistas do período e registrando famílias de seu meio. Realizaram os seus ensaios pessoais e inseriram-se no circuito artístico da cidade.

Hildegard Rosenthal e Alice Brill são vistas como pioneiras em virtude de realizarem ensaios fotográficos no espaço público, principalmente da rua, das suas formas de ocupação e uso pelos moradores de São Paulo e também de algumas outras cidades do Brasil, e por serem fotojornalistas, apresentando um olhar moderno e humanista nesta expressão artística. Como contraponto, os estúdios fotográficos, dirigidos por mulheres, nos anos de 1920 e 1930, existentes em São Paulo, realizavam principalmente retratos de adultos e crianças e allbum de formatura em ambientes fechados.

         Ambas geraram a sua produção fotográfica, criando os seus acervos imagéticos, principalmente nas décadas de 40 e 50, deixando de atuar profissionalmente na área fotográfica, no decorrer deste último período.  A redescoberta de seus acervos de imagens e o reconhecimento como artistas, somente veio, a partir de meados dos anos 1970, com a realização de várias exposições na cidade e a doação de parte da produção para o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo e a aquisição dos acervos pelo Instituto Moreira Salles, respectivamente, de Hildegard Rosenthal, em 1996, e de Alice Brill, em 2000. É importante afirmar que as duas mulheres artistas, além de terem criado relevante acervo documental, sua produção expõe caráter autoral.  

nota biográfica:

 

Yara Schreiber Dines

Mestre e Doutora em Antropologia Social, Pós Doutora em Fotografia, na Universidade de São Paulo. Professora Substituta da Unesp Franca, Pesquisadora Associada do Laboratório de Imagem e Som em Antropologia - LISA/USP e do Grupo de Estudos de Antropologia Contemporânea - GEPAC/Araraquara. Autora do livro Cidadelas da Cultura no Lazer – uma reflexão em antropologia da Imagem sobre o Sesc São Paulo (São Paulo, Sesc São Paulo, 2013) e de diversos artigos. É curadora de exposições fotográficas. 

 

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Depoimento

Juvenal Pereira, agosto 2013

Silvia Czapski, junho 2013


 

[1] Didi-Huberman, em Ante el tiempo (2008), cria uma relação entre a noção de despertar e a criança, a partir de ideias de Benjamin sobre a criança e o jogo. Neste sentido, soa bastante rica a utilização desta noção para entender a educação e  as influências que  as duas artistas, em estudo, tiveram na Alemanha.  Como afirma Huberman, “Benjamin, ... é portador de uma ´energia infantil´ que remete ao jogo, aos movimentos que a criança executa ao praticá-lo. A ação da criança, além de revolver, contar, classificar caprichosamente os ´trapos´, inclui o dormir sobre eles e o despertar  após ter sonhado. Nesta intersecção produzida entre o dormir e o despertar - ´o instante bifacial do despertar´, propõe Didi-Huberman - se constrói para Benjamin, o conhecimento.”  (DIDI-HUBERMAN, 2006:21) (minha tradução do texto). Além disso, comenta Didi-Huberman,  Benjamin ao retomar o texto ´Moral del Juguete’ (1853), de Charles Baudelaire,  aponta ´poderes dialéticos´ do jogo - uma mistura incessante de elementos que se contrapõe, por meio dos quais se pode perceber “ tanto uma ´primeira iniciação da criança na arte´ como uma instância do conhecimento.” (Idem, p. 22)

[2] Assim, ao que parece, as tias ocultaram Hildegard em um armário, durante alguns meses, para que o avô paterno não soubesse da criança. O avô descobre a história e fica muito feliz. A estrutura desta história assemelha-se a de um mito, pois Hildegard Baum teria ´ficado em uma câmera escura´,de acordo com o fotógrafo Juvenal Pereira, dentro do armário, vendo somente sombras desenhadas - um “destino projetado”.

[3] . GONÇALVES, Paula Chrystina Scarpin. Vale das Rosas. Hildegard Rosenthal - pioneira da fotografia no      Brasil. São Paulo, Trabalho de Conclusão de Curso, ECA/USP, 2007:21

[4]. Tive acesso a uma versão em português do livro, realizada por Inês Czapski  Dellape, filha de Alice Brill.  Neste livro,    Marte narra, por meio de  personagens fictícios, as passagens, desventuras e experiências vividas por ela e Alice, no    seu período  de exílio na Europa e de enraízamento  no Brasil. 

 

labrys, études féministes/ estudos feministas
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