labrys, études féministes/ estudos feministas
janeiro/ junho 2016 - janvier/juillet 2016

 

 

 

Cópia e paródia:

práticas de si na arte contemporânea de mulheres e a crítica feminista à História da Arte[i]

Luana Saturnino Tvardovskas

 

Resumo:

Esse artigo discute algumas práticas presentes na produção visual de artistas contemporâneas como Nicola Costantino (Argentina), Cindy Sherman (EUA) e Cristina Salgado (Brasil), pensando-as como intervenções críticas feministas nos discursos tradicionais sobre a História da Arte. A cópia e a paródia – enquanto escolhas políticas, éticas e estéticas – serão problematizadas como táticas de desconstrução de gênero e, ao mesmo tempo, como denúncias de uma discursividade hegemônica dessa disciplina. . Pretende-se, dessa forma, pensá-las a partir de Michel Foucault como práticas de si, na medida em que permitem a elaboração de subjetividades femininas críticas dos estereótipos misóginos da cultura e afirmativas da liberdade.


Palavras-chave: crítica feminista da arte, mulheres artistas contemporâneas, cópia e paródia


 

problematizando a originalidade artística

Ao consenso da cultura se opõe a coragem da arte em sua verdade bárbara.

Michel Foucault, A coragem da verdade, 2011.

 

 

No Brasil, a produção artística de mulheres vem sendo recentemente explorada em suas especificidades de gênero, no entanto, ainda há um grande percurso a se avançar em termos de uma análise de suas táticas e estratégias feministas. Não sendo eu uma crítica de arte, mas uma pesquisadora feminista, pretendo discutir a temática da originalidade artística, propondo algumas possibilidades de leitura de obras das artistas contemporâneas Cindy Sherman (EUA), Cristina Salgado (Brasil) e Nicola Costantino (Argentina), observando-as em contraste com os discursos hegemônicos da disciplina História da Arte e do próprio patriarcado, por meio de imagens paródicas, de cópias e repetições.

As concepções de originalidade e de genialidade embasaram grande parte da literatura sobre arte no século XX, numa estratégia que afastou as mulheres do espaço de reconhecimento e valor da arte. Mais do que denunciar as causas dessa exclusão ou mesmo incorporar nomes ao inventário da disciplina, historiadoras feministas como Griselda Pollock refletem sobre as configurações simbólicas, históricas e políticas que constituíram, no mundo moderno, uma separação estrutural entre o feminino e a arte. Não se almeja aqui, contudo, a construção de uma História da Arte feminista, visto que esse é um anseio totalizante que não contempla a multiplicidade das inscrições femininas presentes na arte contemporânea ou a diversidade das experiências de mulheres artistas em outros tempos históricos (Pollock, 2007: 143).

Se essa parece ser uma ambiguidade, o que ela pode nos revelar, segundo Pollock, é que a busca por sanar os silenciamentos e vazios deixados pela História da Arte canônica não pôde realmente fazer com que o trabalho cultural das mulheres se tornasse uma presença ativa em nosso imaginário. O que nos compete, assim, é a formulação de reflexões e pesquisas que possam transformar a ordem do discurso, como problematizou Michel Foucault, buscando erodir as hierarquias de gênero, em movimentos desconstrutivos (Foucault, 1996a: 22).

Há que se distinguir, inicialmente, que os feminismos possuem já uma longuíssima elaboração teórica, não se restringindo às caracterizações por vezes repletas de prejuízos e temores pautados em estereótipos sociais. A história das mulheres, advinda da reivindicação pela memória – perante o silenciamento e desconhecimento acerca dos temas e das problemáticas femininas – é um dos aspectos desse movimento. O que as vozes e as experiências das mulheres, historicamente menosprezadas, ignoradas em livros, cânones e compêndios teriam a nos dizer? Nesse processo, revisitar as artistas do passado adquiriu relevância, sobretudo nos EUA e na Europa a partir dos anos de 1970, juntamente com a ebulição dos feminismos e da contracultura. Notou-se – o que para nós hoje já pode parecer óbvio – que as mulheres não estavam presentes nos centros de poder e de visibilidade de sua época, assim como não tinham o mesmo prestígio social e histórico. Anônimas, elas não faziam parte da memória social, não tinham os mesmos incentivos para o estudo e não eram, de fato, consideradas capazes de grandes feitos ou obras-primas. Nesse cenário, o corpo feminino, espaço de resistência feminista por excelência, passou a ser utilizado como um lugar de insubordinação e de ruptura por muitas mulheres artistas contemporâneas, como indicou Norma Telles:

"O elemento subversivo nas últimas décadas não tem sido a denúncia de injustiças sociais contra as mulheres, mas o rompimento do sistema de representação dominante. “Todos/as podemos ser outro/a (Collado,1999:79)”. As artistas se aproveitam da ideia de maleabilidade feminina para tornar evidente a falácia de um corpo inato, biológico, suporte instintivo de um gênero indistinto. O corpo instável oferece oportunidade de novas aberturas, novas identificações, novos prazeres. Ideias elaboradas durante todo um século e que se projetam para o novo milênio." (Telles, 2006: web)  

Qual a importância de compreendermos as obras de arte de mulheres dentro dessa perspectiva? Valeria pensarmos, em diálogo com Foucault, em como essas artistas criam um tipo de pensamento crítico em que provocam, diagnosticam e procuram transfigurar o presente. Nesse movimento, transfiguram também a si mesmas, por meio de práticas de si poéticas e criativas, celebrando “(...) the power of images to disclose new possibilities of relating to others and ourselves” (Tanke, 2009: 161). Nossa atualidade, constituída por relações de poder, sejam essas de gênero, raça, classe social etc., nutre e reverbera nessas produções, mas, em contrapartida, a arte é espaço de produção de discursos, de afetos e de rupturas subjetivas, agenciando-se continuamente. Como afirmaram Norma Broude e Marry D. Garrard, uma das críticas fundamentais nas décadas mais recentes

“[...]has been the notion of gendered subjectivity – the idea that every artist or writer responds to the world and represents it in artistic constructions, consciously or unconsciously, from the position of gendered experience”. (Broude e Garrard, 2005: 03)   

Para Julia Kristeva, a arte pode ser pensada como um meio privilegiado de revolucionar o campo simbólico e social, na medida em que transforma a ordem dos significados, fazendo com que novas concatenações de significantes e de relações subjetivas sejam possíveis por meio dela (Kristeva apud Pollock, 2007: 152). Foucault também afirma essa vinculação ética entre arte e vida em sua já consagrada questão “Why should a painter work if he is not transformed by his own painting?”, indicando a relação entre a constituição das subjetividades e os atos de criação (Foucault, 1996b: 379).

O que é a arte e como nos relacionamos com ela são aspectos que se transformam social e historicamente e, no entanto, o discurso hegemônico sobre a arte reafirma que ela é eterna e única, sendo aquilo que não se deteriora e portadora de uma aura metafísica. Ela atualiza-se, o que significa que diferentes épocas podem reconhecê-la como objeto de valor e apreço, mas não necessariamente pelos mesmos padrões ou características; e tampouco se pode dizer que apenas a qualidade e o valor artístico são necessários para que uma obra de arte e um artista se transformem, respectivamente, em uma obra-prima e num gênio canônico. Ser um mestre, no sentido do imaginário e do status quo, refere-se a criar obras verdadeiramente únicas e por meio das quais o humano atinge uma experiência elevada de contemplação e sublimação.

Para a Idade Média, no entanto, a arte assumia outras concepções e o artista representava um imaginário já definido pela argumentação religiosa ou mítica, sem propriamente dedicar-se à originalidade. A concepção e noção modernas de arte estão fortemente vinculadas ao final do século XVIII e início do XIX, ao fortalecimento da figura do autor e do artista individual (Foucault, 1992). E não é verdade que consideramos, hoje ainda, que o artista necessita expressar sua genialidade, criando obras imortais? Quem realmente quer ser imortal? (talvez, perante o mercado de megacolecionadores, poderíamos reformular a atualidade dessa questão para “quem quer ser milionário”?) A quem importa isso?

O anseio por originalidade perdura em nossos discursos acadêmicos e culturais e é urgente pensarmos os cânones como uma “estratégia discursiva na produção e reprodução da diferença sexual”, nas palavras de Pollock (2007: 145). O que se acaba por ocultar, aí, é o infinito jogo de repetições, reproduções, releituras, referências e cópias constituinte de cada trabalho de criação, em nome de um valor, seja esse simbólico, cultural ou mesmo financeiro. Se hoje e, sobretudo a partir do modernismo, muitos artistas explicitaram e renegociaram com tais postulados, não podemos ignorar que grande parte da produção acadêmica sobre a História da Arte segue sublinhando a suposta originalidade como um valor intrínseco da arte, elencando e hierarquizando artistas e suas produções. Para Pollock:

"Por lo tanto, no hay manera de, ni tiene sentido, “añadir mujeres al canon”. Existen, no obstante, modos productivos y transgresivos de releer el canon y los deseos que representa; de hacer lecturas deconstructivas de la formación disciplinaria que establece y mantiene bajo vigilancia el canon; de cuestionar las inscripciones de femineidad en la obra de artistas viviendo y trabajando bajo el signo de la Mujer, que se formaron en femineidades histórica y culturalmente específicas. Y finalmente existen modos de cuestionar nuestros propios textos por los deseos que inscriben, por la apuesta que simulamos contando historias de nuestros egos ideales: las artistas que nos llegan a fascinar y que necesitamos que nos fascinen para encontrar un espacio cultural y una identificación para nosotras mismas, un modo de articularnos a nosotras mismas – para crear una diferencias en los sistemas actuales que manejan la diferencia sexual como una negación de nuestra humanidad, creatividad y seguridad". (Pollock, 2007: 156)

Utilizar a criatividade é saber-se livre, mas não propriamente genial – e isso as mulheres artistas parecem ter afirmado em diferentes épocas históricas, pois estiveram continuamente envolvidas nas Belas Artes, seja como artistas, espectadoras, patronas ou curadoras (Broude e Garrard, 2005: 03). O rosto, o nome, o autor poderiam ser abandonados, para que pudéssemos nos lançar a novos relampejos imaginativos, como postularam Foucault e Barthes (Pollock, 2001: 11). O novo tido como o potencial de invenção, não é o mesmo que ser original. É possível gerar o novo, ainda que explicitemos as cópias e referências às quais recorremos?

Esse processo assemelha-se a um método arqueológico, se pensarmos no sentido foucaultiano de genealogia da História, em que não são buscadas as “verdadeiras” origens límpidas e nobres, mas são explicitados os embates e lutas existentes nos começos. A genealogia é cinza, diz Foucault, e está marcada pelo calor das disputas pelo poder:

“[...] ela é meticulosa e pacientemente documentária. Ela trabalha com pergaminhos embaralhados, riscados, várias vezes reescritos” e “o que se encontra no começo histórico das coisas não é a identidade preservada da origem – é a discórdia entre as coisas, é o disparate” (Foucault, 1978: 15-37).

Isso sugere que precisamos nos despir de nossas pretensas valorações e jogos de poder em busca do original, passando a buscar na arte aquilo que irrompe com a ordem estabelecida, que faz vibrar, ranger as estruturas, que refrata o já conhecido em inúmeros flashes não vivenciados.   

Essa “vontade de originalidade” configura-se como certa vontade de poder, o que não significa que os artistas considerados geniais e originais devam ser abandonados. Mas há que se pensar nas práticas históricas que os fizeram ocupar um lugar dentro do discurso canônico, por meio de uma narrativa reproduzida, na qual o artista cumpre certos requisitos específicos, completando uma teleologia dentro da História da Arte: ele é incompreendido, ele enxerga coisas não vistas pelos homens comuns, ele é compreendido unicamente pelos seus pares...

Tocamos, assim, no ponto nodal sobre o qual gostaria de refletir aqui: o original é criação do indivíduo masculino em nosso Ocidente cristão (e mesmo mais recentemente, as mulheres criadoras passam ainda despercebidas aos discursos oficiais e legitimadores). Não é raro identificar nos discursos históricos do século XIX, as mulheres artistas tidas como amadoras e certamente vistas como aquelas incapazes do original e, portanto, devotas da cópia dos verdadeiros mestres, como mostrou no Brasil a pesquisadora da arte e socióloga Ana Paula Simioni (2008). No entanto, para Barbara Godard, o procedimento da imitação é parte constituinte do processo criativo:

For copying may be a method of learning: at certain times in the history of art and literature, imitation of, or quotation of classical models has been a highly approved method of instruction, young artists being encouraged to copy before looking to nature, or to themselves, for truth” (Godard, 1987:web).

Mesmo o trabalho de copistas antes da invenção da imprensa fora respeitado e visto como parte constituinte da divulgação do conhecimento literário, científico e artístico: “Nacida antes de la invención de la imprenta y prolongada, incluso cuando los medios mecánicos de reproducción de imágenes fueran descubiertos en el siglo XIX, esta actividad sigue siendo practicada ampliamente por pintores y, en gran medida, por mujeres”. (Sofio, 2008; Lebovici, 2008: 38). O menosprezo pela cópia, assim, faz parte de uma ordem discursiva contemporânea, atuante e produtora de hierarquias de longa duração, e não a-históricas ou naturais. Os usos da cópia, na arte contemporânea de mulheres, teriam algo a nos dizer? Passarei nas próximas páginas a destacar e buscar compreender alguns sentidos dessas estratégias de cópia, assim como da citação e da paródia na produção contemporânea de mulheres, lendo-as num viés feminista.

 

refrações

A repetição pertence ao humor e à ironia, sendo por natureza transgressão, exceção, e manifestando sempre uma singularidade contra os particulares submetidos à lei, um universal contra as generalidades que estabelecem a lei.

 Gilles Deleuze, Diferença e Repetição, 2006.

Dentro da historiografia feminista da arte, a paródia tem sido percebida como uma imitação que busca satirizar ou ridicularizar o original, mas também, como uma imitação complexa, que introduz - explícita ou implicitamente - significados dissonantes nas leituras, conformando-se como uma prática subversiva. A cópia, aqui, tem um sentido de crítica política das bases estruturantes da História da Arte, pois explicita sua própria estratégia de ser derivativa, de não poder ser única ou original, já que o espaço de criação das mulheres não é considerado um lugar real de fala dentro do regime masculino (Irigaray, 2009). Perante o desejo construído de um artista ser único, original ou genial, mulheres artistas tem abandonado essa discursividade, mostrando a incapacidade desse lugar de dar resposta à criatividade das mulheres no mundo ocidental. Para Linda Hutcheon, a paródia é um processo estrutural que retoma, repete, reinventa e recontextualiza obras de arte existentes, criando uma distância crítica apresentada como ironia (Hutcheon, 1985: 143). Também afirma ser a paródia uma prática ambivalente, ao mesmo tempo de imitação e diferença.

 

Cindy Sherman, Untitled #488 (Mini), 1976, fotografias preto e branco recortadas e montadas sobre papel, 16 ¼ x 39 ¼ inches,

Collection of Elizabeth and Frank Leite, Prescott, Arizona.

Uma das mais importantes fotógrafas contemporâneas, a artista norte-americana Cindy Sherman, nascida em 1954, apresenta imagens em que a cópia e a paródia adquirem interessantes sentidos feministas. Em um período inicial de sua produção, como na obra Untitled #488, de 1976, a colagem de autoimagens em preto e branco criava um espelhamento de si em lentíssima transformação. Por meio da repetição de si vestida com minissaia, pernas à mostra, óculos redondos e sapatos de salto alto, encena uma jovem pouco sensual que se olha por todos os ângulos em um espelho invisível. Se buscarmos referências dentro do cânone, poderíamos associar esse sentido de movimento e seus frames aos estudos fotográficos de Thomas Eakins ou Étienne-Jules Marey; talvez aos cavalos em trote de Muybridge ou mesmo às capturas cubistas de Duchamp, em Nu descendo a escada, de 1912. Nesse percurso, no entanto, talvez percamos de vista que aqui a imagem não ressalta a velocidade ou a amplitude de um movimento, mas apresenta espectros tão lentos que não nos geram qualquer sentido de transformação subjetiva óbvio.

Se pensarmos diferencialmente em como a performance de gênero é repetida incessantemente até o sentido de realidade se impor como natural, tal como apresenta Judith Butler, a obra de Sherman adquire um interessante prisma de crítica cultural (Butler, 2003). Como pensar, em uma perspectiva feminista, sobre tais refrações? Em que ordem do discurso elas intervêm? A repetição, aqui, como estratégia crítica, sugere não a repetição do Mesmo, do feminino tido como elemento imutável, ligado à natureza. Pensando com Deleuze na célebre frase de Hume:“a repetição nada muda no objeto que se repete, mas muda alguma coisa no espírito que a contempla” (apud Deleuze, 2006: 111), aqui a repetição é causadora de um transtorno na constituição das subjetividades, perturbando as imagens e autoimagens estáveis de gênero. Como afirma Catherine Morris a respeito da formação educacional de Sherman, período de criação dessa obra,

“Consciously or not, making the choice to transform and manipulate her own body as subject has its roots in the feminist discourse of ideation established by these pioneering artists” (Morris, 2005: 9-10).

Outra colagem, do mesmo período, Untitled #489, apresenta a artista travestida e atuando como homem. Essa multidão e multiplicação de sua autoimagem – crítica das padronizações de gênero – aparece em diferentes obras de sua carreira, em que encena figuras como socialites, palhaços, divas de cinema e obras-primas da História da Arte. A dessubjetivação promovida em seus autorretratos distorcidos, irônicos e paródicos, é destacada por Margareth Rago:

"Especialmente forte é o contraste do ato de falar de si sem constituir uma narrativa autobiográfica, de produzir um eu fictício para expressar uma crítica social à identidade feminina e às representações dominantes do corpo feminino, valendo-se do próprio corpo, fazendo de si mesma a personagem central. Sem visar a um autodesvendamento ou a uma afirmação de si, ao contrário, dessubjetivando-se e irrealizando-se na proliferação de figuras femininas previsíveis e estereotipadas, e questionando o próprio uso da fotografia como representação fiel da realidade, Sherman manifesta, pela arte, suas críticas às formas culturais falocêntricas, e expõe suas próprias interpretações da contemporaneidade. Põe em cena as múltiplas maneiras pelas quais as mulheres são trazidas na cultura, pela mídia, pelas artes visuais ou pelo cinema, e revela a natureza construída dessas representações (...). Essas imagens subvertem, produzem deslocamentos, denunciam as prisões identitárias, riem de nós mesmas." (Rago, 2013: web)

Valeria recorrer, ainda, a uma artista brasileira: Cristina Salgado, carioca nascida em 1957, que questiona ao longo de sua produção as imagens do corpo feminino, dialogando com o surrealismo e com a fragmentação subjetiva acarretada pelo olhar masculino e patriarcal (Tvardovskas, 2015: 232). Em uma série produzida nos anos de 2006 e 2007, intitulada Carimbo – Londres[ii], Salgado reproduz em um carimbo de tinta simples a imagem de Vênus, escultura em mármore romana datada de aproximadamente 100-150 DC, exposta no British Museum. Salgado utiliza a reprodução sistemática dessa imagem canônica para produzir vórtices e campos gravitacionais. Contagiam-nos a ironia e o humor dessas imagens, ao inverter a organicidade estática da estátua de mármore, imortal e gélida, fazendo-a dançar, trombar consigo mesma, rodopiar, atravessar paredes, adquirir novos contornos e leituras.

Cristina Salgado, British Museum, 2006-2007, série Carimbo-Londres. Foto Wilton Montenegro.

O lugar do feminino na arte - como apontaram diferentes pesquisadoras feministas - esteve ao lado da musa, daquela que era sempre observada, mas não agia ou criava, inspirando os artistas homens, silenciosamente. Nas obras de Salgado, a musa, pasmem, acordou! Multiplicou-se, desdobrou-se – como em outras de suas obras: as esculturas em tecido, por mim analisadas em outro momento (Tvardovskas, 2015: 250). Aqui, Salgado não produz apenas uma inocente repetição, mas uma paródia do modelo de feminilidade por excelência: a Vênus em pose reproduzida de Botticelli (O nascimento de Vênus, 1483-85) a Jacques Stella (Vênus, 1640), tensionando a longa duração desse pathosformel, se pensarmos na proposta warburguiana.[iii]    

 

a maternidade e a morte

 

Para teóricas feministas como Rose Braidotti, Luce Irigaray e Kristeva, a feminilidade precisa ser vista enquanto parte de um processo de constituição das subjetividades, o que permite observarmos como as imagens formuladas por mulheres na atualidade posicionam-se, muitas vezes, nas margens dos discursos hegemônicos sobre os sexos. Para Kristeva, a Mulher “não existe”, sendo um lugar instável de posicionamento negativo, muito mais do que qualquer designação ou demarcação fixa. A referência da feminilidade está, para ela, construída em oposição ao masculino, como uma perda, uma exterioridade, que serve ao mesmo tempo como lugar de coesão para a identidade masculina.

A mulher, tomada como a falta na teoria lacaniana – vista em posição negativa e sem voz, pois para Lacan, as mulheres não poderiam ser inteiras, porque não possuem uma posição fixa –, foi contrastada por Irigaray e Kristeva, que criticaram a impossibilidade de constituição de subjetividades femininas dentro desse sistema. Para Kristeva, as mulheres, em sua diferença, não biológica, mas pela experiência de cisão com a mãe e sua relação particular com o corpo, poderiam recriar a cultura, por meio do excesso e do transbordamento da linguagem. Um desses aspectos de recriação é a presença da morte nas obras de arte, lugar em que a ansiedade reprimida da morte ressurge deslocada, em forma desfigurada. (Bronfen, 1992: 215).

Outro tema pungente revela-se nas problematizações da maternidade, em que se desconstrói a imagem ideal do feminino: a mãe. Nicola Costantino, artista argentina nascida em 1967, em Rosário, utiliza em diferentes trabalhos de uma construção fotográfica paródica de obras-primas canônicas, inserindo aspectos desconstrutivos nos discursos de gênero, como quando aborda a imagem da Virgem amamentando o menino Jesus. Em Madonna, de 2007, Costantino parodia a obra clássica Madonna Litta (1490), de Leonardo da Vinci, amamentando um porquinho embalsamado, como num thriller aterrador.[iv]

Nicola Costantino, Madonna, 2007.

Sherman, em Untitled #216, de 1989, relê às avessas a obra de Jean Fouquet, Diptych de Moulin. Madonna and Child. Left panel, de 1450. Segundo Rago, “Entre 1989-1990, quando vive na Itália, Sherman compõe seus ‘History Portraits’, isto é, um conjunto de trinta e cinco fotografias, em que parodia obras clássicas dos grandes mestres do Renascimento, do Barroco e de períodos posteriores” (Rago, 2013: web). Como apontou Kimberlee A. Cloutier-Blazzard a respeito de Sherman, a imagem da amamentação da Virgo Lactans, apresentando a ligação corporal e visceral entre o seio e a criança, foi negada pelo imaginário cristão da Contrarreforma católica até a atualidade, embora fosse comum após o Concílio de Trento (1545-63) (Cloutier-Blazzard, 2007: web). Ao escolher essas imagens, e não outras, da virgem que nina um deus-porco ou, como em Sherman, da madona cujo seio está criticamente plastificado e artificial, as artistas indicam esferas de percepção crítica e subjetiva, também presentes em Untitled #225 e Untitled #223, ambas de 1990.[v]

Cindy Sherman, Untitled #216, 1989.

Analisando a escrita literária, Margareth Rose vê a paródia como um exercício de metaficção que funciona como uma arqueologia de seu próprio meio, escavando sentidos e significados, sem acesso total ou verdadeiro ao original. (Rose, 1979: 13). Alguns temas destacam-se por sua capacidade perfurante, sobrepondo mitologias e cristalizações culturais reiteradas pelas clássicas visões realistas de obras-primas consagradas. Refiro-me agora à morte de Ofélia, personagem de Hamlet (1599-1601), de William Shakespeare, em que a figura feminina repousa em um lago, morta, embora sua beleza a dignifique no imaginário. Como um pathos, podemos perceber similaridades em Ofelia, muerte de Nicola no. 2, de 2008, de Costantino e Untitled #153, de 1985 e a imagem de mulher vagando num rio, Untitled #38, 1979, da série Film Stills (1977-80), ambas de Sherman (Tvardovskas, 2015: 406).

Nicola Costantino, Ofelia, Muerte de Nicola no. 2, 2008.

Cindy Sherman, Untitled #153, 1985.

Cindy Sherman, Untitled #38, série Film Stills, 1979.

Elaine Showalter, em seu ensaio "Representing Ophelia: Women, Madness, and the Responsibilities of Feminist Criticism", discute como essa personagem foi usada como símbolo nas teorias psiquiátricas freudianas e lacanianas, contribuindo para a caracterização dos atributos da feminilidade na modernidade.[vi] Para a autora, a figura de Ofélia reforça a loucura atribuída ao amor melancólico feminino, associado no imaginário a uma paixão erótica entre ela e Hamlet. Mesmo havendo outras possibilidades interpretativas, como a que vê sua loucura resultante do assassinato de seu pai e da relação de profundo respeito entre eles – sendo os sentimentos dela pelo pai muito mais fortes do que por Hamlet –, Showalter mostra como a insanidade causada pela paixão é a visão predominante.

Mesmo negligenciada pela crítica literária, tratada por muitos como uma personagem insignificante, Ofélia é uma das heroínas mais citadas de Shakespeare: “Her visibility as a subject in literature, popular culture, and painting, from Redon who paints her drowning, to Bob Dylan, who places her on Desolation Row, to Cannon Mills, which has named a flowery sheet pattern after her, is in inverse relation to her invisibility in Shakespearean critical texts” (Showalter, 1985: 77). Classicamente, a temos representada também por Eugène Delacroix (A morte de Ofélia, 1838) e John Everett Millais (A morte de Ofélia, 1851-1852). Para Showalter, Ofélia tem uma importância em nossa mitologia cultural pois, mesmo reiterando a figura da “Mulher” em sua imagem de fraqueza e loucura, ela também sofre a opressão dessa sociedade de forma trágica. Esse arquétipo da mulher enquanto loucura e da loucura como mulher precisa ser problematizado, e, para a autora, a crítica feminista deve se responsabilizar por discutir as representações de Ofélia em nossos discursos. Showalter mostra também que para as feministas francesas como Irigaray, sua imagem “confirm the impossibility of representing the feminine in patriarchal discourse as other than madness, incoherence, fluidity, or silence”, desprovida de voz, de passado e de sua própria sexualidade: “I think nothing, my lord”, Ofélia diz a Hamlet na cena de Mousetrap (Showalter, 1985: 78).

"According to David Leverenz, in an important essay called “The Woman in Hamlet,” Hamlet's disgust at the feminine passivity in himself is translated into violent revulsion against women, and into his brutal behavior towards Ophelia. Ophelia's suicide, Leverenz argues, then becomes “a microcosm of the male world's banishment of the female, because ‘woman’ represents everything denied by reasonable men.” (Showalter, 1985: 78)

E aqui, talvez, possamos pensar no banimento do feminino dentro da cultura ocidental e nos sentidos dessa repetição para as artistas contemporâneas. Para Showalter, muitas das representações modernas de Ofélia reforçaram a associação entre a feminilidade e a loucura, mas sugiro que as paródias de Costantino e Sherman destoam dessa discursividade, ao instaurarem um aspecto teatralizado e irônico nessa aproximação. Se Ofélia é sempre vista como produto do corpo e da natureza femininos, aqui há uma interferência da violência com que as figuras são apresentadas. O vestido de Nicola, rasgado e sujo, ambienta uma cena mais violenta e conflituosa do que o suicídio plácido representado em nosso imaginário. Talvez até mesmo denuncie um assassinato. A imagem de Sherman, de forma similar, sugere que essa Ofélia foi engolida e cuspida por uma tormenta. Também podemos pensar em como essas obras ironizam, de certa forma, as obras-primas que visavam imortalizar seu autor, assim como o desejo de permanência e enaltecimento: “A obra que tinha o dever de trazer a imortalidade recebeu agora o direito de matar, de ser assassina do seu autor” (Foucault, 1992).

Há um efeito complexo de superposição nessas obras, pois enquanto existe uma crítica implícita da cristalização forjada no imaginário cultural sobre o lugar das mulheres enquanto natureza, loucura e maternidade, há também um posicionamento dessas artistas enquanto vozes de autoridade sobre essas representações que definiram e definem as mulheres enquanto corpos sexuados, silenciados e violentados. O contraste, por sua vez, com as representações plácidas e docilizadas da maternidade e da morte, indica um ímpeto de transformação subjetivo, que explora as possibilidades e as múltiplas aberturas para a construção das feminilidades na atualidade.

 

conclusão: ambiguidades

O que pode significar esse desdobramento infinito da cópia? Leio que essas práticas de artistas como Sherman, Salgado e Costantino espelham criticamente a constituição das subjetividades femininas enquanto repetição do Mesmo, denunciando a ausência de espaços de criação e de possibilidades de ser outra. Ao serem explicitamente cópias, mostram as formas e definições do feminino enclausurado pela cultura, impelindo a novas visões e configurações éticas. Por fim, descaracterizando uma visão platônica, esses simulacros prescindem da divisão entre original e cópia, mostrando as cavernas superpostas, nas palavras de Deleuze:

"Quando a identidade das coisas é dissolvida, o ser escapa, atinge a univocidade e se põe a girar em torno do diferente. O que é ou retorna não tem qualquer identidade prévia ou constituída: a coisa é reduzida à diferença que a esquarteja e a todas as diferenças implicadas nesta e pelas quais ela passa. É nesse sentido que o simulacro é o próprio símbolo, isto é, o signo na medida em que ele interioriza as condições de sua própria repetição. O simulacro aprendeu uma disparidade constituinte na coisa que ele destituiu do lugar de modelo." (Deleuze, 2006: 106-107)

Num trânsito entre ficção, paródia e realidade, essas artistas dialogam com suas próprias constituições subjetivas, sendo a arte uma prática de si, no sentido foucaultiano de elaboração ética e de experiência radical da verdade (Foucault, 2011: 165). Não podemos afirmar seus propósitos, mas lê-las, sim, como parte de uma elaboração crítica sobre as definições, mitos e simbologias que estigmatizam as mulheres no mundo ocidental. O efeito cômico e paródico, como dissemos, é capaz de destruir os significados originais e demonstra aspectos incongruentes ou discrepantes dos mesmos, impondo-se como uma função crítica, tal como afirma Godard. Para Rose, é justamente a ambiguidade o aspecto fundamental ao conceito de paródia, criando uma aparente empatia e distância em relação ao original. Não há uma similitude entre essas obras, se pensarmos no conceito de Deleuze, pois o que elas procuram justamente é criar uma diferença em relação aos textos e obras referenciadas.

Essa transgressão, muito bem apontada pela crítica literária feminista, ganha potentes dimensões quando problematizada nas artes visuais de mulheres (Hutcheon, 1985). Se as imagens aqui discutidas distorcem os originais, satirizando-os e mostrando sua ridicularidade para a atualidade, também ganham sofisticação e perspicácia, ao explicitar as margens desses discursos e onde eles ainda nos afetam, indicando a superposição de temporalidades. Questionam, assim, o próprio modelo de transmissão imposto pela discursividade hegemônica da História da Arte, recusando-se a dele participar.

Para vermos esses sinais, no entanto, é preciso decifrar os subtextos e oscilações que essas imagens produzem, não apenas no terreno das representações, mas também das subjetividades. E esse é um trabalho arqueológico e artesanal que exige do observador uma cumplicidade com cada artista e uma tomada de posição em relação às tormentas que cada obra lhe pretende causar. As obras devem ressoar, afetar e implicar ao observador um compromisso ético de aproximação, buscando, como afirma Godard, “a vertiginous spiral of ironies within ironies”, abrindo-nos ao seu potencial subversivo para que possamos compartilhar com elas um sorriso. Se não estivermos atentos a isso, corremos o risco de realmente ler nessas imagens uma reverência ao original e, na repetição, o signo do Mesmo que elas buscam demolir.

 

Bibliografia

Braidotti, Rosi. 2000. Sujetos Nómades. Barcelona: Paidós.

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Sites

As imagens desse artigo foram retiradas dos seguintes sites:

http://www.cristinasalgado.com/

http://www.moma.org/interactives/exhibitions/2012/cindysherman/

http://www.nicolacostantino.com.ar/

 

Biografia

Luana Saturnino Tvardovskas é historiadora, pós-doutora e professora do Depto. de História do IFCH, UNICAMP. Pesquisa e escreve sobre a produção de mulheres artistas, crítica feminista da arte e a constituição das subjetividades na atualidade. É autora de Dramatização dos corpos: arte contemporânea e crítica feminista no Brasil e na Argentina (São Paulo: Intermeios, 2015), além de capítulos e artigos nessas temáticas.


 

[i] Esse artigo é inédito e foi apresentado no IX Seminário Arte, Cultura e Fotografia - Imagens: Práticas e Metodologias, Grupo de Estudos Arte e Fotografia, departamento de Artes Plásticas ECA/ USP, de 15 a 19 de setembro de 2014, MAC, USP.

[ii] Para ver a série completa, acessar http://www.cristinasalgado.com/

[iii] Aby Warburg propôs um modelo cultural para o estudo da história, “um modelo fantasmal da história, no qual os tempos já não se calcavam na transmissão acadêmica dos saberes, mas se exprimiam por obsessões, ‘sobrevivências’, remanências, reaparições das formas. (...) O devir das formas deveria ser analisado como um conjunto de processos tensitivos – tensionados, por exemplo, entre vontade de identificação e imposição de alteração, purificação e hibridação, normal e patológico, ordem e caos, traços de evidência e traços de irreflexão”. (Didi-Huberman, 2013: 25)

[iv] A obra utiliza as esculturas de animais embalsamados, como Chanchobolas, que são feitas com fetos de consumo massivo – como porcos, bezerros, frangos e avestruzes –, feitas por compactação ao comprimir seus corpos em recipientes esféricos.

[v] As imagens podem ser vistas em http://www.moma.org/interactives/exhibitions/2012/cindysherman/ acesso 05set2014.

[vi] Showalter afirma acerca do seminário de Jacques Lacan em Paris, em 1959: “He goes on for some 41 pages to speak about Hamlet, and when he does mention Ophelia, she is merely what Lacan calls “the object Ophelia”—that is, the object of Hamlet's male desire. The etymology of Ophelia, Lacan asserts, is “O-phallus,” and her role in the drama can only be to function as the exteriorized figuration of what Lacan predictably and, in view of his own early work with psychotic women, disappointingly suggests is the phallus as transcendental signifier. To play such a part obviously makes Ophelia “essential”, as Lacan admits; but only because, in his words, “she is linked forever, for centuries, to the figure of Hamlet.”

labrys, études féministes/ estudos feministas
janeiro/ junho 2016 - janvier/juillet 2016