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janvier / juin 2013  -janeiro / junho 2013

Gênero, Shoujo Mangá e História Alternativa: Reflexões sobre Ooku de Fumi Yoshinaga

Valéria Fernandes da Silva

Resumo: A possibilidade de reinventar o passado exerce grande atração sobre escritores, cineastas e, também, quadrinistas ao longo de séculos.  A pergunta “E se?” possibilita inúmeras reflexões a respeito de questões políticas, sociais, econômicas e, também, sobre gênero.  Em 2005, a quadrinista Fumi Yoshinaga iniciou a série Ooku, mostrando um Japão feudal no qual boa parte da população masculina foi dizimada por uma peste e as mulheres assumiram o poder.  Contando com nove volumes até o momento, a série vem reconstruindo meticulosamente o passado de um Japão no qual, por força das circunstâncias, a organização social, as relações de poder e os costumes precisaram ser reinventados.  Neste texto, discutiremos como os papéis de gênero são apresentados, questionados e reconstruídos pela autora, assim como sobre as questões feministas presentes da obra.

Palavras-chave: gênero, Japão, shoujo mangá, História


 

O que aconteceria se uma peste dizimasse boa parte dos homens de uma determinada sociedade e as mulheres tivessem que ocupar funções outrora consideradas masculinas?  Quais seriam os problemas enfrentados pela população ao ter que redefinir a estrutura social e os papéis de gênero?  Haveria resistências, sem dúvida, mudanças rápidas, outras nem tanto, acomodações.  Como seria este mundo?

Em nosso artigo pretendemos discutir uma das obras mais recentes do quadrinho japonês a abordar a possibilidade de uma sociedade diferente daquela na qual vivemos, abrindo a possibilidade para várias discussões a respeito de hierarquias, papéis sociais.  A diferença em relação à tradição da ficção científica nipônica, e mesmo ocidental, escrita por mulheres é que Ooku de Fumi Yoshinaga não fala do futuro, mas do passado.  Yoshinaga não constrói um mundo novo, mas se apropria de fatos históricos, de textos conhecidos das historiadoras e historiadores, e reinventa de forma criativa e corajosa parte da história do Japão.  Ao longo de sua série são colocadas em discussão questões que nos são contemporâneas lado a lado com outras que consideramos distantes dos dias atuais.  O que a autora nos mostra é que, através de uma obra de ficção, é possível ao mesmo tempo “(...) sacralizar o passado e questioná-lo ao mesmo tempo” (Hutcheon, 1991: 165). 

Xógum Yoshimune (Ōoku, vol. 7) © 2011, Hakusensha

 

FICÇÃO CIENTÍFICA E A AUTORIA FEMININA

Durante décadas, as japonesas têm produzindo mangás, termo aplicado para os quadrinhos japoneses, comercialmente e para seu próprio consumo.  Trata-se de uma fatia de mercado vigorosa e, todos os meses, cerca de duas dezenas de revistas chegam às livrarias. As revistas shoujo[1] tem um perfil muito variado em virtude do recorte etário e temático da publicação, no entanto, o que prevalece é que as autoras são praticamente todas mulheres.  Trata-se de uma singularidade japonesa, pois ao compartimentar o mercado de quadrinhos por demografias,[2] compreende-se que as mulheres possam produzir séries que atendam ao seu quadro de interesses, que expressem seus sonhos, temores, críticas sem se preocuparem com um público masculino consumidor, como acontece no Ocidente. (FUJINO, 1995:15-18)

“Ser ao mesmo tempo a criadora e a fruidora da literatura (...) deve ser visto como um extraordinário ato de coragem” (MANGUEL, 1997: 260)[3] e, também, como algo libertador.  Esta estrutura editorial aparentemente segregada permite que as obras das autoras japonesas não sejam avaliadas simplesmente pelo olhar dos críticos do sexo masculino, mas a partir de outros parâmetros que tem sempre em vista seu próprio público consumidor.  Assim, nos mangás que produzem, as japonesas mostram que, mesmo em uma sociedade marcadamente patriarcal, as mulheres podem ter voz e receber reconhecimento por suas obras e salários que na base ou no topo não são inferiores aos salários dos artistas homens. 

Desde a década de 1970, um dos gêneros muito explorados pelas japonesas em seus quadrinhos é a ficção científica.  Uma das marcas frequentes desse tipo de material é um questionamento a respeito das relações sociais, da forma como a sociedade se organiza e dos papéis de gênero.  Autoras como Hagio Moto e Takemiya Keiko, mestras neste tipo de história, imaginaram futuros nos quais a rigidez dos papéis de gênero era erodida, questionada, ou se mostrava permeável, mutável.  Segundo Akiko Ebihara, tais preocupações estão praticamente ausentes da ficção científica escrita por homens. (EBIHARA, 2003)

Muitas das obras mais importantes de ficção científica produzidas no Japão estão em formato mangá e foram escritas por mulheres.  Uma das possíveis explicações para isso é exatamente a existência de um mercado editorial até certo ponto segregado, como descrevi acima.  O espaço das revistas shoujo não é totalmente livre, já que se trata de um negócio que precisa ser lucrativo, mas é elástico o suficiente para que as mulheres possam desenvolver histórias que em outras mídias não seriam tão bem aceitas. Ebihara oferece também outro esclarecimento: a literatura de ficção científica no Japão é um campo dominado por homens. 

No Ocidente, ao contrário, autoras de ficção científica e fantasia adotavam pseudônimos masculinos ou abreviavam (e abreviam ainda) seus nomes para tentar dissimular o fato de serem mulheres.  Este é o caso, por exemplo, de Dorothy Catherine Fontana, que com os nomes de “D.C. Fontana”, Michael Richards e J. Michael Bingham escreveu muitos dos roteiros da série original de Jornada nas Estrelas.  Outro caso conhecido é o de Alice B. Sheldon, que publicava com o nome de James Tiptree, Jr.

Desde 1991, este é o nome de uma premiação literária que contempla trabalhos de ficção científica ou fantasia que expandam ou explorem a compreensão sobre os papéis de gênero.  O James Tiptree, Jr. Award é uma premiação que se preocupa em dar visibilidade a trabalhos com um viés feminista.  Ooku, de Fumi Yoshinaga, foi um dos trabalhos contemplados em 2009, trata-se do único mangá a receber o prêmio até hoje.

 

REINVENTANDO O PASSADO

Ooku é um mangá que conta, no momento, com nove volumes encadernados e é o trabalho mais longo da autora, Fumi Yoshinaga.  A série é publicada mensalmente em capítulos na revista Melody, desde 2005, e foi licenciada em três países do Ocidente até o momento: Estados Unidos, França e Itália.  O sucesso de crítica e público no Japão fez com que partes da história fossem adaptadas em dois filmes para o cinema (2010 e 2012) e um seriado para a TV (2012). A própria escolha de uma adaptação com atores e atrizes de carne e osso e, não, em formato animado, já sinaliza que o público alvo da produção é de pessoas adultas, especialmente, mulheres.

Diferente do material shoujo mais convencional, que é voltado para meninas adolescentes e mantém a tradição de ter como protagonistas personagens com a mesma idade das leitoras alvo, Ooku escolhe adultos como protagonistas.  Algumas das personagens são acompanhadas desde a sua mocidade – nascimento, em alguns casos – até a sua morte.  No entanto, o maior protagonista da série é a própria sociedade e suas instituições, que precisam se adaptar rapidamente, abandonando estruturas patriarcais de poder em prol de uma organização na qual as mulheres passam a ocupar posições, de mando e no mundo do trabalho, outrora vedadas para elas. 

Ooku se passa no período Edo (1603-1868), que foi dominado pelo clã Tokugawa, o auge do Xogunato ou Bakufu.  Este período da História Japonesa sucedeu as sangrentas guerras civis (Período Sengoku), momento em que os europeus chegaram ao arquipélago trazendo, entre outras coisas, o cristianismo e as armas de fogo, e foi marcado pela relativa paz interna e isolamento do Japão em relação a outros países. 

O xógum, que residia em Edo, atual Tokyo, era um líder político e militar que se encontrava no topo de uma complexa hierarquia composta por outros senhores de terras e homens, além de guerreiros samurai de diferentes categorias. O imperador, cuja corte se encontrava em Kyoto, tinha funções cerimoniais, e o poder de fato estava nas mãos do xógum. 

Houve mulheres que ocuparam o trono imperial em diferentes períodos da História do Japão, mas todos os xóguns foram homens.  Uma das idéias mais assentadas é a de que o poder político durante o Xogunato é indiscutivelmente masculino e tal visão do período é perpetuada na maioria das produções – cinema, TV, mangás – da cultura pop japonesa.

A varíola vermelha atinge principalmente homens jovens. (Ōoku, vol. 3) © 2007, Hakusensha.

Ooku começa com um capítulo que serve de prólogo e que narra o início de uma epidemia, a chamada varíola vermelha, que dizima principalmente a população masculina jovem do país.  O avanço da epidemia é rápido, até que a proporção passa a ser de um homem para cada cinco mulheres.  No primeiro volume, que se passa oitenta anos depois do aparecimento da doença, seguimos a ascensão ao poder da oitava xógum, Tokugawa Yoshimune.[4]  Vinda de uma província afastada e de hábitos austeros, acompanhamos a sua estranheza em relação ao intrincado cerimonial da corte em Edo, e sua impaciência em relação ao dispendioso Ōoku, que dá nome para a série.  O harém servia principalmente como uma demonstração do status da governante, como bem descreve uma das personagens no primeiro volume:

Nossas vidas inteiras são em vão e um desperdício. Somos mantidos como peixes dourados em um aquário, (...) sem outra finalidade a não a ser o próprio ato em si. Ter tantos homens em um só lugar, sem nenhum uso real, é deixar a sua preciosa semente ir para o lixo. É um grande desperdício, este luxo, é evidência da força e do poder do Xógum, não é mesmo? (Ōoku, Volume 1)

Administradora responsável, Yoshimune reduz o efetivo do Ooku por questões de economia e, ao final do primeiro volume, decide investigar porque os títulos são masculinos, apesar das mulheres estarem no poder.  Trata-se de um vestígio de outra época e nos volumes consecutivos a autora nos conduz em um longo flashback que tem como objetivo explicar como uma sociedade dominada pelos homens transformou-se estruturalmente até que o poder político e econômico estivesse nas mãos das mulheres.

O Ooku histórico, ou “Grande Interior”, foi estabelecido pelo segundo xógum, Tokugawa Hidetada, em 1607.  Ficava em uma ala isolada do palácio do xógum, e era a residência das concubinas e da esposa do governante.  A tradição reitera que o Ooku era totalmente separado do mundo exterior e uma vez que uma mulher passasse a servir no “Grande Interior” teria que abdicar de quaisquer laços com o mundo exterior.  No entanto, em estudos mais recentes, essa imagem de isolamento é questionada, apontando para certa flexibilidade, a depender da época e de quem estava gerenciando o Ooku.  Assim, havia múltiplas formas de contato entre aqueles que serviam no interior do Ooku – as mulheres do harém, as serviçais, os sacerdotes e sacerdotisas, oficiais – e o mundo exterior. (Hisako Hata, 2008) A representação presente na obra de Fumi Yoshinaga está de acordo com esses estudos mais recentes.

O primeiro volume da série pode ser encarado como uma história independente, o que se explica pela própria dinâmica do mercado editorial japonês.  Se a história atraísse a atenção do público, se fizesse sucesso, ela teria continuidade e foi efetivamente isso que aconteceu.  O último capítulo do encadernado foi inserido para fazer a ponte com o flashback que se seguirá.[5]

Ao longo de sua obra, a autora usa como referência a cronologia tradicional da História Japonesa, só que normalmente trocando o sexo das personagens, desta forma todos os xóguns são mulheres.  A autora também se utiliza de explicações criativas para fatos conhecidos da História do Japão.  Um dos exemplos é o isolamento do país, justificado na obra pela necessidade de esconder a existência da peste, algo que poderia colocar o país em perigo de invasão. 

Yoshinaga não se preocupou ainda em falar do que está acontecendo fora do Japão, ou das origens da peste, mas é sugerido que a epidemia é desconhecida dos holandeses, únicos ocidentais que continuaram mantendo relações comerciais com o Japão depois de 1641.  Uma das questões importantes da série até o momento é garantir que os estrangeiros não saibam que a população masculina do país foi dizimada.  Esse tipo de narrativa é chamada por Umberto Eco de ucronia, uma variação da ficção científica na qual:

(...) o contrafactual assume a seguinte forma: ‘que teria acontecido se o que realmente aconteceu tivesse acontecido de modo diferente – por exemplo, se Júlio César não tivesse sido assassinado nos idos de março?’ Temos ótimos exemplos de historiografia ucrônica usada para melhor entender os acontecimentos que produziram a história atual. (ECO, 1989: 186)

Não são os temas tratados, mas a opção pela ucronia que afasta Ōoku da maioria das ficções científicas produzidas pelas autoras japonesas, que, normalmente, optam por criar futuros longínquos ou distopias em uma Terra pós-apocalíptica.  Sonhar com um futuro no qual as relações entre os sexos e os papéis de gêneros, percebidos como construtos sócio-histórico-culturais, possam ser reinventados ou questionados, parece estar muito mais ao gosto das autoras japonesas e mesmo das ocidentais.  Trata-se de um tipo de ficção científica também chamada de ficção científica social, por se preocupar muito mais com a forma como as sociedades se organizam e com os relacionamentos humanos, do que com alta tecnologia, viagens espaciais e outras características vistas por muitos como indissociáveis da ficção científica.[6]   

Em Ooku, é o passado que serve de matéria bruta para a narrativa de Fumi Yoshinaga, no qual “a história passa a ser um texto, um construto discursivo ao qual a ficção recorre tão facilmente como a outros textos da literatura” (Hutcheon, 1991: 185).  Este uso da História “(...) sugere que houve matérias brutas – personagens e acontecimentos históricos – mas que hoje só as conhecemos como textos”. (Hutcheon, 1991: 188)

Assim como na obra literária, e os quadrinhos são uma forma híbrida de literatura e arte, na qual os autores e autoras dialogam, negociam, criam em cima de textos, nossas fontes históricas, dentro de uma perspectiva pós-moderna, as historiadoras e historiadores também o fazem só que utilizando-se de metodologias, conceitos e teorias próprias.  O fato é que não temos acesso ao passado, mas a textos, e a partir deles tecemos nossas narrativas.

 

  OS PRIMEIROS ANOS DA PRAGA: RESISTÊNCIAS E MUDANÇAS

Em Ooku, é a praga o motor das mudanças sociais.  Os volumes dois e três, o início do flashback, são focados nas transformações e resistências, em como a falta de homens força as mulheres a ocuparem os postos masculinos, em como os homens tentam resistir a tais mudanças.  A autora estabelece como ponto de partida para a sua narrativa o reinado do terceiro xógum, sim, neste caso, no masculino, Tokugawa Iemitsu.  É a morte do xógum, sem deixar herdeiros masculinos, o gerador do drama que norteia a história: como garantir que o Japão não caia em uma nova situação de guerra civil ou seja ocupado por potências estrangeiras. 

Mesmo quando as necessidades de adaptação parecem urgentes, o apego aos papéis de gênero e as assimetrias entre homens e mulheres na sociedade norteiam o comportamento de algumas personagens.  E, nesse sentido, são os velhos e velhas, guardiães da tradição, que mais resistem, pois temem tanto pelo retorno das guerras civis, quanto pelo questionamento dos costumes e dos espaços de poder.  Entre os que lutam para que as coisas não mudem, temos uma das personagens femininas mais proeminentes da época, Kasuga-no-Tsubone (1579 -1643).

 

Kasuga-no-Tsubone, única mulher em um conselho formado por homens. (Ōoku, vol. 3) © 2007, Hakusensha.

Como já pontuei, ao longo de sua obra, Fumi Yoshinaga transforma, para o bem da narrativa, personagens históricas masculinas em femininas e vice-versa.  O único caso em que isso não ocorre, é o de Lady Kasuga, ou Kasuga-no-Tsubone, uma mulher de grande influência política e que foi ama de leite do terceiro xógum.  No mangá, Kasuga se coloca como a guardiã das tradições patriarcais e tenta a todo o custo conter mudanças inevitáveis.

Quando o xógum Iemitsu morre vitimado pela varíola vermelha, Kasuga manda buscar sua filha bastarda, uma criança mantida em segredo, enquanto seu próprio filho assume publicamente, mas sob disfarce, as funções de xógum. A menina não tem nome, ela é simplesmente um receptáculo do sangue dos Tokugawa e existe para gerar um herdeiro do sexo masculino que possa seguir com a dinastia. A filha de Iemitsu é uma continuação do pai. Só que Kasuga não é eterna e Iemitsu só gera meninas.

Os volumes 2 e 3 de Ooku são marcados pelo esforço de duas mulheres, Kasuga e Iemitsu-filha, para tentar manter em segredo que o xogunato está agora nas mãos das mulheres.  Mas Iemitsu se mostra apta a ser não somente a sombra do pai, ou um ventre, mas uma governante capaz de gerenciar o país.  Do mesmo modo, a autora nos mostra outras mulheres mantidas nas sombras, filhas de nobres obrigadas a se vestir e se comportar como homens, fingindo serem os irmãos que nunca tiveram ou que a peste tragou. 

Um dos momentos importantes da série é quando a partir do exemplo de Iemitsu, que, depois da morte de Kasuga, assume publicamente que é uma mulher, outras mulheres também o fazem.  E a sociedade não entra em colapso, não explode uma guerra civil.  As mulheres em Ōoku se mostram capazes de gerenciar as novas condições criadas pela praga, ainda que, pelo menos neste momento da série, exista uma nostalgia em relação aos velhos tempos e a esperança por parte de alguns de que tudo volte á normalidade.  Mas o que é a normalidade, se não a reiteração de práticas sociais? 

 

A NOVA ORDEM: LIMITAÇÕES, INOVAÇÕES E NOVAS FORMAS DE SUBORDINAÇÃO

Para Judith Butler (2004: 41), gênero é uma norma e uma norma não é uma lei, algo fixo, mas “(...) opera dentro de práticas sociais como o padrão implícito da normalização”.  Normas geralmente são implícitas, secretas, difíceis de discernire separar das realidades sociais que instituem.  Assim, o que é feminino ou masculino em uma determinada sociedade precisa parecer aos nossos olhos como algo dependente da natureza e, não de uma série de regulamentos que precisam ser reiterados de múltiplas formas a cada momento.

As discussões em Ōoku se tornam ainda mais interessantes quando a autora sai do harém, do palácio do xógum, e permite que olhemos a forma como as pessoas comuns reagem às mudanças, como aquilo que aparentemente é natural vai sendo erodido por causa das necessidades e pressões de várias ordens. Não há na série uma mudança automática de papéis de gênero e funções sociais.  A autora mostra toda a tensão da velha ordem que se recusa a morrer, e das novas condições que nascem com a praga. 

  Mulheres assumem a chefia das famílias e nos conselhos de aldeia, recusando-se a entregar o poder aos homens velhos ou aos meninos que sobrevivem à praga.  Se elas podem fazer os trabalhos pesados, elas devem ter, também, o poder de decidir.  O que se está demolindo é a “(...) certeza da divisão sexual binária assimétrica e hierarquizada” (NAVARRO-SWAIN, 2007), que nega às mulheres o seu lugar como sujeitos políticos e invisibiliza a sua contribuição nas mais diferentes áreas, como o mundo do trabalho.  No entanto, a nova ordem não é igualitária, é, somente, diferente, pois cria novas formas de subordinação e de hierarquias, que vemos se transformando ao longo dos volumes, pois “relações de gênero são complexas e instáveis” (FLAX, 1991: 228).

Homens passam a ser valorizados por sua semente, sua capacidade de reproduzir.  Assim, muitos deles são vendidos por suas famílias, seja para a prostituição ou o casamento, e poucas mulheres têm condições de ter um marido próprio.  Em momentos de grande fome ou condições pobreza extrema, a autora também mostra o descarte dos idosos, afinal, o valor de um homem é medido pela sua capacidade de reproduzir, sem isso, ele se torna um peso que nem sempre a comunidade pode suportar.

A prostituição masculina em Ooku está pouco associada a idéia de prazer e subordina-se muito mais à necessidade de procriação. Não é a busca pela satisfação sexual que normalmente impulsiona as mulheres na série a procurarem prostitutos, mas a desesperada necessidade de manter linhagens, garantir a sobrevivência das famílias e da comunidade. Em Ooku o “distrito do prazer” continua existindo, mas a busca das mulheres, a maioria sem condições de possuírem um marido próprio, é gerar uma criança. Preocupara com a situação, já que ao inspecionar o “distrito do prazer” descobre que boa parte dos homens locais são velhos ou doentes, a xógum Iemitsu, envia parte dos homens seu harém para os bordéis, como uma forma de fornecer “semente sadia” para suas súditas.

Não existe, no entanto, em nenhum momento a idealização da maternidade como “o doce destino de toda a mulher”, a questão ao longo de toda a série é reduzida a um dever social do qual nem a xógum pode se esquivar. Assim, mesmo depois que Iemitsu se revela para o mundo, que assume sua posição como xógum e abre caminho para que outras mulheres da nobreza possam assumir publicamente que eram “homens travestidos”, ela se submete ao dever de tentar gerar filhos homens, destruindo-se física e emocionalmente no processo.”

 A nova ordem não é perfeita, nem é apresentada pela autora como essencialmente melhor que a anterior.  Yoshinaga monta um grande painel e lança um olhar frio e distante sobre esse novo mundo que está construindo, possibilitando uma reflexão sobre como os gêneros são criados e como aquilo que é criado passa a ser visto como natural. 

Ao reinventar a História do Japão, Fumi Yoshinaga rompe com o

“[...] conforto das continuidades históricas, que legitimam o presente, ao construir identidades fixas e assegurar-nos da existência de um passado organizado, à espera de ser desvelado pelo historiador (...)” (RAGO, 2006).

  E, como a história está em andamento, é possível se perguntar sobre qual presente o mundo de Ooku irá criar.

 

NOVOS E VELHOS PAPÉIS

Ao longo da série a autora mostra como as mulheres ocupam funções outrora tradicionalmente masculinas.  Não se trata somente dos postos de mando, mas, também, de atividades produtivas, algumas exigindo empenho de força física.  Uma das “verdades” que Fumi Yoshinaga não questiona é a idéia de que homens, genericamente falando, são mais fortes fisicamente do que as mulheres, ainda que, e a mortandade masculina devido à praga seja usada como exemplo de que as mulheres são mais resistentes á doenças e adversidades.  Contudo, a autora enfatiza que se um trabalho que exigia grande força física era feito por um homem, ele pode, tranqüilamente, ser desempenhado por duas mulheres em conjunto. 

Não há nada de errado em alterar a forma como as tarefas são desempenhadas, desde que elas sejam bem executadas.  Um dos argumentos machistas mais utilizados no senso comum é o da incapacidade das mulheres para os trabalhos pesados, ignorando que, em várias culturas e ao longo da História, muitas mulheres, principalmente, as mais pobres, tenham desempenhado tarefas tão pesadas quanto as ditas masculinas ou mesmo as mesmas tarefas.  Já os trabalhos pesados desempenhados pelas mulheres, por estarem no campo doméstico, não eram considerados como trabalho e podiam ser apropriadas sem qualquer remuneração, sendo portanto desqualificados. 

É o gênero que cria a diferença, neste caso, a suposta fragilidade física feminina, mediante uma a educação distinta, ensinamentos filosóficos e religiosos, imposição de tarefas diferenciadas para meninos e meninas.  Assim, as tecnologias de gênero,

“[...]o conjunto de efeitos produzidos em corpos, comportamentos e relações sociais”, possibilitam que sejam criados homens e mulheres, com contornos próprios e hierarquizados. (LAURETIS, 1994: 208)

Yoshinaga não atribui valor a essas supostas diferenças.  Em seu mangá, ela somente constata e mostra como as mulheres conseguiram superar barreiras, ou reinventar funções.  Nesse sentido, a autora apresenta no volume 4 algumas inovações tecnológicas atribuídas às mulheres.  São maquinarias reais, inventadas no século XVII japonês, mas que são mostradas pela autora como desenvolvidas para tornar o trabalho das mulheres menos árduo e mais produtivo.  De novo, não há nenhuma depreciação ou valoração, se é possível executar um trabalho com maior rapidez e de forma competente, não há nada que se lamentar, a força física pode ser compensada pelo engenho. 

  

Trabalho pesado e inovações tecnológicas. (Ōoku, vol. 3 e 4) © 2007, Hakusensha.

A questão da procriação é outra das discussões presentes em Ooku.  Mesmo que toda poderosa, a xógum tem o dever de gerar filhos e o ato sexual tem quase como única função cumprir um dever de Estado.  Nos primeiros volumes, os que mostram o início da praga, a necessidade era produzir filhos homens que pudessem restaurar a velha ordem.  Depois, quando não está mais em questão que o poder político seja exercido pelas mulheres, as governantes devem gerar filhas a todo custo.

Não existe, contudo, uma exaltação da maternidade em si, atribuindo-lhe honra ou uma leitura sentimental.  Para as mulheres – especialmente para as xógum – a procriação da espécie é uma necessidade inescapável.  Esse imperativo “[...] apaga toda a multiplicidade de humano transformado em corpo unificado, em pura biologia funcional” (NAVARRO-SWAIN, 2008) e reduz a governante a um ventre.  O Ooku, o harém da xógum, tem como uma de suas funções oferecer uma diversidade de indivíduos que possam auxiliar nesse processo de perpetuação do clã Tokugawa. 

Além da morte da terceira xógum, Iemitsu, devido ás múltiplas gravidezes na tentativa de produzir um herdeiro do sexo masculino, a questão da maternidade é retomada outras vezes na série e temos pelo menos outra xógum, a sexta, Ienobu, que morre devido ao esforço para gerar uma criança.  Entretanto, é através da quinta xógum, Tsunayoshi, uma das filhas de Iemitsu, que a Fumi Yoshinaga questiona a necessidade de subordinar a vida de uma mulher (ou de um homem), seus relacionamentos sexuais e afetivos, à necessidade da procriação.  Ao ser colocada em primeiro plano, a discussão criou um dos momentos mais dramáticos e tocantes da série. 

A autora rejeita veementemente a maternidade compulsória, associando boa parte das misérias da vida da personagem, sua infelicidade pessoal e parte de seu desempenho questionável como governante a uma subordinação ao dever de procriar.  Tsunayoshi perde a filha, a quem dedicava genuíno afeto, no início do volume 5 da série e nunca mais se recupera emocionalmente, ou volta a conceber de novo. 

A discussão é deveras importante, porque o Japão é um dos países com as menores taxas de natalidade do mundo.  Em 2009, o então primeiro-ministro, Taro Aso, disse que era um “dever patriótico” ter filhos. (BDNEWS24, 2009) A reação da opinião pública a esta declaração foi tão forte, que ele teve que se retratar.[7] O fato é que as mulheres japonesas casam cada vez mais tarde e muitas nunca se casam. Na raiz do problema está uma percepção tradicional dos papéis de gênero que obriga, a despeito das próprias necessidades econômicas familiares ou do país, as mulheres a terem que optar entre maternidade e carreira.  (NAOHIRO, 2001)

O Japão é hoje o país do G8 – grupo das maiores economias do mundo – com a pior colocação no ranking de igualdade de gênero e os motivos são a baixa participação das mulheres no mercado de trabalho, com índices ainda menores quando se trata de posições gerenciais ou dentro do governo, e a legislação arcaica. (IPCDIGITAL, 2012).

A questão é muito atual e alguns dos capítulos do volume que colocou em pauta o dever de ter filhos foram publicados entre 2009 e 2010.  Ao trazer a discussão para dentro de sua série, cujo público é majoritariamente adulto e feminino, a autora certamente está marcando uma posição que está conectada de certa forma com as discussões feitas pelas teóricas feministas.  O fato é que tem sido muito difícil para os governantes japoneses convencerem as mulheres a casarem, já que ser mãe solteira é um estigma social, e procriarem tendo que abrir mão de possibilidades concretas de carreira.  A própria autora, assim como uma parte considerável das artistas que produzem mangá, não é casada, tampouco tem filhos. 

Por fim, apesar do romance heterossexual estar presente na série, e ser importante em muitos momentos, ainda que não tenha sido alvo deste artigo, são as amizades entre as mulheres, que produzem os relacionamentos mais duradouros e estáveis.  Yoshimune e Hisamichi, Iemitsu e Kasuga, Tsunayoshi e Yanagisawa, Ienobu e Manabe.  Todas as xógum tem uma mulher que lhes servem de braço direito e melhor amiga. 

É muito comum nos mangás femininos japoneses a exaltação da amizade entre as mulheres.  Não raro, partindo de um estranhamento ou mesmo situação de conflito, são tecidos laços de solidariedade e afeto em que uma mulher ou menina é capaz inclusive de abrir mão de seu interesse amoroso em prol da amiga.  Curiosamaente, alguns estudiosos ocidentais consideram essa capacidade de desprendimento, como sintoma de submissão feminina e, não, de compreensão que a amizade tem, sim, um papel importante na vida das mulheres. (SCHODT, 1983, LUYTEN, 2000)

No caso de Kasuga e Iemitsu, não se trata de uma relação de amizade, há toda uma assimetria que colocava a xógum em posição de tutela. Somente quando Kasuga está velha demais, Iemitsu começa a confrontá-la de forma sistemática e madura.  Já os outros pares normalmente trazem a xógum e alguém que é profundamente devotada a ela, capaz de tudo pela sua soberana. 

O primeiro par de amigas a aparecer na série é Yoshimune e Hisamichi, ambas partilham de um projeto de reformas políticas, e se conhecem desde a infância.  Há mesmo uma intimidade entre as duas que burla em vários momentos a hierarquia e a etiqueta.  Já Manabe e Yanagisawa tem uma devoção tão grande às suas xóguns, tão extremada, que é levantada por alguns personagens a suspeita de que a amizade oculta um relacionamento amoroso.   

O fato é que em Ōoku, Fumi Yoshinaga deu preferência até o momento aos relacionamentos heterossexuais.  E isso é novidade em sua obra, pois a autora construiu sua carreira produzindo mangás centrados principalmente em romances homoafetivos, que são muito populares entre as japonesas.  Em Ōoku, o relacionamento afetivo entre homens é apresentado como um ato de egoísmo, desperdício de semente, o que se justificaria no drama gerado pela peste.  No caso das mulheres, a questão não foi valorada, nem discutida ainda.  A autora simplesmente deu abertura dentro do volume 6, o mesmo que critica o dever de subordinar as afetividades á procriação, para que Yanagisawa se declarasse à xógum Tsunayoshi em seu leito de morte.  Neste caso, havia desejo para além da amizade e da devoção.

 

Yanagisawa e Tsunayoshi, uma amizade que acompanhou todas as fases da vida.  (Ōoku, vol. 6) © 2007, Hakusensha.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ooku é uma obra ainda inacabada.  Se a previsão inicial da autora for cumprida, teremos doze volumes ao todo.  O caráter aberto dos mangás, com a possibilidade das leitoras interagirem com a autora, escreverem cartas, terem pedidos atendidos dentro da história, pode, sim, ter impacto sobre os rumos da série.  O fato é que entre o volume 1, uma obra fechada, e o volume 7, o último que pude ler, há várias mudanças e contradições que apontam para esse caráter dinâmico das produções em quadrinhos japoneses.

No volume 1, por exemplo, Yoshimune, a sétima xógum, questiona a afirmação do capitão holandês de que as mulheres seriam frágeis e, por isso, não aguentariam a longa travessia da Europa para o Japão.  Já no volume 7, a mesma Yoshimune, que questiona a lógica do patriarcado em relação às linhagens (“Mãe uma certeza, pai uma presunção”) e afirma que as mulheres teriam maior capacidade para governar, mantém o fechamento do Japão aos ocidentais sob o argumento de que homens são fisicamente mais fortes e que os exércitos devem ser formados por eles e não há homens suficientes no Japão.  Apesar desses pontos de conflito, Ōoku levanta várias discussões feministas importantes e é uma obra que tem atraído atenção por seguir na tradição da ficção científica japonesa feminina, que questiona papéis de gênero, sem simplificações ou maniqueísmos, e imagina novos mundos possíveis. 

Diferente de quadrinhos ocidentais que trabalham com a mesma temática, isto é, a praga que dizima os indivíduos do sexo masculino, como Y – O Último Homem, de Brian K. Vaughan e Pia Guerra, Ooku não mostra mulheres incapazes de manter o mundo funcionando, de produzirem para seu sustento e reorganizarem a ordem social.[8] A escassez de homens na história de Yoshinaga conduz á reinvenção da sociedade, que não é caracterizada como justa e não-violenta, mas que aponta para a competência das mulheres e sua capacidade de cooperar entre si e com os homens que restaram.

Não é possível prever como  Ooku irá terminar, ou que presente aquele mundo irá produzir.  O fato é que a série se junta a uma fértil produção feminina que busca sonhar com outros mundos e Histórias possíveis e que, felizmente, está conseguindo sair do Japão e ser apresentada ao mundo.

 

Nota biográfica

Valéria Fernandes da Silva é historiadora, doutora em História pela UnB com tese defendida na linha de Estudos Feministas e de Gênero.  Professora de História no Colégio Militar de Brasília, trabalha com mulheres no século XIII, e, também, desenvolve trabalhos sobre as questões de gênero dentro das Histórias em Quadrinhos, e sobre o uso das HQs em sala de aula.

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[1] A palavra japonesa “少女” (garota, menina) pode ser transliterada para o alfabeto ocidental como shoujo, forma que utilizo neste artigo, ou shōjo, opção igualmente comum.

[2] Shoujo/meninas adolescentes, Josei/mulheres jovens e adultas, Seinen/homens jovens e adultos, Shounen/garotos adolescentes, etc.

[3] Esta frase de Alberto Manguel se refere à literatura produzida pelas damas na corte Heian (794-1185), que escreviam para seu próprio círculo, usando de uma linguagem própria e sem o objetivo de atingir o público masculino.  Alguns dos fundadores da literatura japonesa são mulheres da Era Heian, como  Murasaki Shikibu e Sei Shônagon. 

[4] Os xóguns que apareceram na série até o momento são: Tokugawa Iemitsu, Tokugawa Ietsuna,Tokugawa Tsunayoshi, Tokugawa Ienobu, Tokugawa Ietsugu,  Tokugawa Yoshimune e Tokugawa Ieshige.

[5] No filme para o cinema de 2010, o último capítulo do volume 1 não faz parte do roteiro.  O filme se fecha em si mesmo, porque, da mesma maneira que no caso do quadrinho, poderia não existir uma continuidade.

[6] A escritora feminista Margaret Atwood defende que o termo “ficção científica” não se aplicaria a este tipo de história e prefere usar “ficção especulativa”.  Em uma entrevista recente, Atwood defende que a ficção especulativa – que englobaria boa parte das narrativas que discutem questões de gênero – trataria de mundos e sociedades possíveis, enquanto a ficção científica trataria daquilo que dificilmente poderia vir a acontecer.

[7] Este ano, agora como ministro das finanças, Aso voltou a cometer uma gafe ao dizer que os idosos doentes devem “morrer rapidamente” para o bem da economia, despertando nova onda de críticas.  (Estadão, 2013)

[8] Há inclusive a inserção de um grupo feminista, o único por sinal da história, as Amazonas, que consideram a morte de todos os homens uma bênção e querem destruir o último homem.  Elas também são caracterizadas como lésbicas, como forma de reforçar seu ódio ao homens.  Ou seja, as únicas feministas da históriaposicionam-se contra o herói.  Y – O Último Homem também recebeu o James Tiptree, Jr. Award e é apresentado por alguns como uma obra feminista, o que dificilmente se sustenta.   

 

 

labrys, études féministes/ estudos feministas
janvier / juin 2013  -janeiro / junho 2013